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Ah, a primavera!
Como é bom quando chega a primavera! As flores desabrocham, os passarinhos cantam, os animaizinhos saem das tocas para aproveitar o sol, as temperaturas são amenas e todos são felizes e cantantes. Principalmente os alunos do colégio Dong Soon, pois estava chegando a época do Baile de Primavera e o Concurso de Talentos, que animava os alunos recém-chegados das férias de inverno.
O baile daquela vez não era o interessante, diferente de todos os anos que gerava uma comoção dos alunos seja para arrumar o evento, seja para arrumar um par. O evento do ano era o Concurso de Talentos por um motivo muito especial, resumido em 3 letrinhas: CBX. CBX nada mais era que uma banda de garagem formada por três garotos que arrancavam suspiros de alunos e um polegar levantado dos professores de música. Eles eram bons, tinham um bom vocal e presença de palco, o problema era que naquele ano seria seu último "show" — ou melhor, apresentação deles no show de talentos — na escola já que dois dos membros se formariam naquele ano. Como se já não bastasse toda essa comoção com a ida da banda mais amada do colégio, dessa vez teria um diferencial: um dos membros havia se formado no ano passado e não poderia participar do show de talentos naquele ano, portanto…
— Dae, Dae, Dae! — Yeri entrou na sala de treino toda saltitante, os cabelos negros longos e levemente ondulados balançavam de um lado para o outro.
— Eu, eu, eu! — entrou na onda dos pulinhos também, sem saber por que ela estava tão animada. — O que houve?
— Você viu? — perguntou com um sorriso radiante e começou a procurar algo por seus bolsos quando o rapaz respondeu que "não" com a cabeça. Então, tirou um papel vermelho da bolsa transversal e o esticou bem no rosto dele, perto até de mais para ser lido. — A CBX está fazendo audições e você precisa entrar!
— A o quê? — ficou surpreso e pegou o papel em mãos, lendo por si próprio: aquilo era um pôster de divulgação da audição da banda mais famosa do colégio. — Isso é sério?
— Seríssimo, e você precisa participar!
— Eu não sei não, eu não acho que eu faça o estilo deles… — comentou inseguro, coçando a nuca meio tímido.
— Faz sim, você tem todos os requisitos listados, olha: — foi para seu lado e apontava a pequena lista com a ponta da unha. — Você é estudante da Dong Soon? Sabe técnicas vocais? Sabe tocar no mínimo um instrumento? Tem tempo livre para os ensaios? — para cada pergunta, Jongdae respondia que sim com a cabeça. — Então pronto, você tem tudo o que precisa para fazer parte da banda! Participa, vai… — pedia com um biquinho e balançando seu braço para lá e para cá.
— Você vai participar das audições, Dae? — Chungha perguntou timidamente. Havia acabado de chegar para mais um ensaio do Clube de Música e não conseguiu evitar de ouvir a conversa na sala quase vazia.
— Olha, eu…
— Vai sim! — Yeri respondeu por ele. — Você vai?
— Acho que sim, parece ser divertido participar de uma banda… — comentou com um sorrisinho, ajeitando a mecha solta do rabo de cavalo para atrás da orelha.
— Mas a banda não é só de garotos? — Jongdae perguntou com os cenhos franzidos.
— Bem, não tem nada no pôster dizendo que garotas não podem participar. — Chungha respondeu e a outra concordou.
— Realmente… — Ele murmurou lendo os requisitos. — Pegou mal o que eu falei, né? Desculpa…
— Ah, tá tudo bem, Chen! Não precisa se desculpar — Yeri deu um tapinha meio forte em seu ombro.
— E você, Yeri? Você também canta bem e sabe tocar um instrumento musical. Vai se inscrever? — Chungha perguntou curiosa
— Não, não… Não tenho muita vontade de participar de uma banda, e o instrumento que eu toco talvez não seja o que eles procuram. — disse meio sem graça. Para uma banda de rock, talvez a flauta doce não seria exatamente o que eles queriam. — Eu quero é que o Chen participe!
— Vai pelo menos para tentar, nunca se sabe. — A outra menina também tentou estimular, mostrar apoio, talvez mudasse de ideia.
— Tudo bem, vou pensar — deu-se por vencido e bufou.
— Pense com carinho! — as duas falaram ao mesmo tempo e riram, e Chungha se separou para pegar um lugar na sala antes que ela começasse a encher.
Jongdae passou o treino inteiro pensando na possibilidade de realmente fazer a audição e daquela vez teve sorte de as aulas serem introdutórias já que haviam acabado de voltar de férias. Se realmente tivessem que fazer treinos práticos, estaria ferrado. Sua cabeça estava nas nuvens, divagando, só pensando em como seria se realmente passasse e entrasse para a CBX. Além de ser uma ótima experiência caso futuramente quisesse trabalhar em uma banda e para desenvolvimento de suas técnicas vocais, seria uma forma de divulgar seu pequeno canal de covers no YouTube. Não que fama no colégio seja tudo isso, mas querer uns inscritos a mais não fazem mal a ninguém, não é?
No entanto, e se não fosse tão bom assim? Talvez os membros não sejam tão legais, os ensaios puxados de mais, ou as brigas para o estrelismo e para ver quem tinha a opinião mais forte os dominasse, e temia que isso acontecesse já que odiava ambientes do tipo. E se não fosse tudo isso ter a atenção do colégio inteiro e estivesse sendo ambicioso demais? Jongdae bufou alto demais para o silêncio da sala, expulsando aqueles pensamentos ruins de sua cabeça. Estava perdido!
Estava tão avoado, tão envolto em situações imaginárias, boas ou ruins, sobre como seria ter uma banda que a aula passou em um instante. Logo, o garoto guardava seus materiais e saía de sala de forma automática, quase como um robô. Só voltou com os pés no chão quando esbarrou em algo molhado no corredor e se assustou imediatamente.
— Olha por onde anda. — Sehun brincou dando um empurrãozinho de leve no menor. Ele estava com os cabelos medianos presos, sua camisa de basquete dos Houston Rockets ensopada, assim como resto do corpo pingando de suor. Jongdae percebeu isso e logo fez uma expressão de nojo. — Está indo para onde perdido assim?
— Isso é suor?
— Nah, água do banho. Fiquei com preguiça de enxugar tudo. — Jongdae deu de ombros ainda sem acreditar muito em sua palavra. — Mas estava andando desatento por aí por que? Pensando em alguém?
— Não, não mesmo. Eu estava pensando em umas coisas aí… Mas deixa para lá. Daqui a pouco sai o nosso trem, melhor a gente se apressar.
O Oh, mesmo a contragosto, decidiu deixar para lá apesar da curiosidade. O restante dos músicos saía e, junto deles, vinha Yeri, já grudando no primo e Chanyeol logo atrás. Os quatro, por pegarem o mesmo metrô, sempre se encontravam no lado de fora da sala após as aulas extraclasse para que não se perdessem.
Era uma rotina desde que Jongdae entrou para o colégio no oitavo ano. Era muito tímido para pedir ajuda, parecia perdido naquela nova cidade e os veteranos não foram lá muito receptivos por ter caído lá de paraquedas. Então, naturalmente, foi parar no escanteio da sala, junto com dois outros tímidos: Yeri e Sehun, dois novatos vindos dos Estados Unidos que pareciam mais perdidos que ele. A barreira linguística era uma dificuldade para se enturmarem com os outros alunos — por falarem mais inglês que coreano —, mas deram sorte de encontrarem alguém tão bondoso como Jongdae, que logo ganhou o apelido carinhoso “Chen”, para lhes ensinar coreano novamente e traduzir o que podia para inglês. Daquela forma, o trio foi cada vez se tornando mais próximo e, no primeiro ano do ensino médio, o grupo ganhou um quarto membro. Ele era um dos sobreviventes da turma C, que foi dissolvida pela falta de matrícula naquele ano e não demorou nem um pouco para se juntar com eles, principalmente por dois deles fazerem parte do clube da música.
— Ah, Chan, eu esqueci de perguntar! — Yeri falou quebrando o silêncio enquanto os quatro caminhavam para fora do prédio. — Você vai participar das audições para a CBX?
— Eles estão fazendo audições? — perguntou surpreso. Costumava ser muito avoado, sempre sabendo de tudo o que acontecia no colégio por último já que não era muito de se atualizar, vivia em seu próprio mundinho. Yeri fez que sim e pegou o folheto para lhe mostrar. Ele aproximou do rosto para ler, não gostava de usar seus óculos de leitura e sua visão não era muito boa, ainda mais para letrinhas pequenas. — Pff… São só esses os requisitos? Então vou participar. Já me vejo tocando com eles e arrasando corações.
— Abaixa a bolinha, Yeol. Você nem passou e já está de história… — Sehun repreendeu balançando a cabeça.
— E precisa de muito para saber que eu sou o melhor guitarrista que tem do clube da música? A hora que eu tocar meus solos de guitarra eles vão me aprovar na hora. Eu sou melhor até que os próprios membros dessa bandinha de merda — dizia todo nariz em pé, enquanto os três amigos se entreolharam segurando a risada.
— Olha… A escola inteira vai competir nessas audições, não acho que vai ser tão fácil assim — Yeri tentou o acalmar.
— Até porque, você vai competir comigo — Jongdae disse convencido, entrando na onda também.
Chanyeol olhou furioso, e os dois primos se entreolharam, compartilhando o pensamento de “Ah não, de novo não! ”. Eles já estavam acostumados, Chanyeol era terrivelmente competitivo, sempre querendo ser o melhor em tudo, e em qualquer mínima situação. Era o tipo de pessoa que chorava se perdia em jogos de carta, e não descansava até se ver como o número um. Diferente de Jongdae, que na maioria das vezes levava tudo na esportiva, mas ai de quem pisasse em seu calo. Ele virava na hora um competidor nato. Aquele caso era diferente, Jongdae gostava mesmo era de ver Chanyeol pilhado, de implicar com ele e o ver todo bravinho para ser o primeiro lugar, o melhor. Então entrava na onda, mesmo sem querer realmente ganhar. O problema é que com isso eles ficavam insuportáveis, e os dois primos eram praticamente obrigados a escolher um lado, a torcer por alguém, e ficarem toda a hora com aquela competição boba enchendo seus ouvidos. É, estavam ferrados.
— Ah é? Então quer dizer que você quer competir comigo? — Chanyeol parou no meio do caminho, olhando desafiador e de braços cruzados.
— Um orelhão desse tamanho e ainda não tá me ouvindo direito? — Jongdae parou também, o encarando numa cena digna de anime de ação, ainda mais porque sabia como ele ficava irritado quando falavam de suas orelhas. — Eu disse, vou competir com você e melhor: vou ganhar. Eu vou ser o C do CBX, entendeu?
— Hah, não mesmo! Vai sonhando. Todo o mundo sabe que eu sou o maior guitarrista do clube de música. Eu que vou ser o C do CBX.
— E eu o melhor vocalista. Vamos ver se o Baek vai curtir seu solo bosta de guitarra.
— Eu aposto que ele vai gostar mais que seus gritinhos idiotas.
— Quantos minutos já se passaram? — Yeri perguntou para Sehun, olhando no relógio do celular.
— Acho que uns… Dois? Sei lá — Sehun deu de ombros. — Mas se eles demorarem demais, nós vamos perder o trem — Depois de dizer isso, conferiu novamente a hora no relógio e percebeu que deveriam se apressar. — Ei, ei. Chega logo dessa briga, porra. Vamos perder o trem!
Mas os outros dois pareciam não ouvir seu aviso, então Yeri gritou entre os dois para que parassem e então puderam sair dali. Mesmo com a briga apartada, Jongdae e Chanyeol ficaram o caminho inteiro se encarando de forma desafiadora, vez ou outra trocando umas farpas. Não sabia se eles dois iriam aguentar até amanhã para esperar para se inscrever. Os formulários estavam com Baekhyun e ele havia saído da aula antes deles. Só sabiam de uma coisa: precisavam ganhar a qualquer custo agora que já estavam nessa competição.
…
No dia seguinte, os dois músicos chegaram na escola agitados, doidos para pegar os papéis de inscrição, era algo bem organizado. Ainda mais porque Minseok, um dos membros, não era nem bobo de pensar que aquilo daria pouca gente, então desde o início começaram a enumerar os competidores. Chanyeol e Jongdae eram de uma turma diferente da de Baekhyun, então precisam esperar até a hora do almoço para pegarem os papéis. No entanto, assim que o sinal bateu, a correria corriqueira para pegar um bom lugar na fila do refeitório se transformou na correria para se inscrever. O problema é que, quando chegaram perto de Baekhyun, ele avisou que ainda estava sem fichas, só esperando imprimirem mais na xerox e que deveriam esperar mais um pouco. O que foi um tapa para a impaciência dos dois. Trêmulos com tanta energia competitiva e segurando algumas provocações, esperaram “pacientemente” para pegar seus pratos junto dos dois amigos ali e, daí, pegar uma mesa. De preferência, bem pertinho da dos CBX.
E então começou o momento de tensão. Uma garfada, uma olhada em volta, uma encarada. Uma bebericada no suco de uva, mais uma olhada em volta, uma encarada na mesa dos músicos, uma alfinetada um ao outro. Aquele comportamento estranho só não era mais estranhado por Sehun e Yeri pois eles já estavam mais acostumados com eles loucos em competições e apostas internas. Ficaram daquele jeito por mais alguns minutinhos até que finalmente conseguiram ver as folhas chegando até a mesa. O negócio é que os papeis não chegaram nas mãos de Minseok ou de Baekhyun, chegaram nas mãos de Junmyeon, irmão mais novo do Kim e a pessoa mais linda do mundo segundo Oh Sehun, que não poderia ficar mais de um segundo no mesmo ambiente que o garoto sorridente que ficava babando por ele secretamente. E isso todos os três — e outras pessoas de fora — notavam com facilidade e o espírito e zoar com a cara dele conseguia ultrapassar a vontade de se inscrever primeiro. As risadinhas com a troca de olhares e o aceno tímido um para o outro não demoraram para vir.
— Ei, Sehun, por que não vai lá pegar os papeis para a gente? — Jongdae sugeriu com um sorriso travesso, acompanhado dos outros dois.
— Vocês não têm pernas não, porra? — perguntou furioso sabendo das intenções deles.
— Temos, mas não queremos usar. Tô com preguiça. Pega para a gente? — o Park fingiu cansaço, forçando até um bocejo.
— É, qual o problema de ir lá pegar o papel?
— O problema é que… É que eu não quero — deu uma mordida grosseira na maçã que veio junto. — Se vocês estão competindo, vocês que peguem.
— Mas nós também não queremos pegar.
— Então fiquem sem, ué.
— Poxa, Hun, você bem que podia pegar para eles… Qual é o problema? Eles só pediram um favor… — Yeri pediu com um falso tom de inocência sendo que estava na zoeira junto também. No entanto Sehun não parecia se convencer e dar o braço a torcer.
— Que foi? Não quer pegar o papel só porque o Junmyeon está com eles? — Jongdae foi mais direto, tocando logo na ferida, e ele parou de mastigar na hora.
— Sério que é só por isso? Que bobeira… — a outra se fez de desentendida. — Um homem grande desses com medinho de falar com o líder de torcida?
— Eu não estou com medo, é só… — Sehun tentou se explicar meio nervoso, o que não ajudou muito.
— É só vergonha! Está tímido para falar com o Kim, né? O tanto tempo que você passa comendo esse garoto com os olhos já era para vocês estarem bem resolvidos.
— Pede logo esses papéis para ele! — gritou Chanyeol sem paciência, e Sehun saiu de fininho da mesa, com o rabo entre as pernas.
Não sabia como alguém tão para a frente como ele tinha tanta vergonha de falar com Junmyeon, que nem era alguém difícil de se abordar por ser tão gentil com todos. Mas lá estava o altão andando em passos pequeninos, mais ofegante que se tivesse jogado basquete por 3 horas. Quando enfim chegou na mesa, ficou parado olhando para o menor, travado, a mente completamente em branco o fez esquecer completamente o que iria dizer. O garoto mais baixo estranhou o que estava acontecendo, esperando que Sehun dissesse alguma palavra, até que o Kim mais velho o acordou dos devaneios.
— Tá olhando o que, Oh? — Minseok perguntou impaciente, quase em um rosnado. — Perdeu alguma coisa aqui?
— Não! Eu… É… — acordou no susto, estalando os dedos para se lembrar o que iria fazer, enquanto os outros três amigos riam atrás de si de sua desenvoltura. — É que eu preciso de dois… É.... Papéuzes.
— Dois o quê? — Junmyeon perguntou confuso.
— Papeles — respondeu direto, como se a palavra escapasse de sua boa, mas logo percebeu o que tinha falado.
— É que o plural de papel é papéis. — Junmyeon comentou sem graça, ainda sorrindo para o Oh. — Mas mesmo assim… Aqui. — Folheou o bolo de papéis e tirou dois, entregando para o maior. — Você vai participar?
— Eu? — pensou por um momento, processando a pergunta. — É que meu talento é só basquete mesmo… E você?
— Não das audições, mas vou participar do show dançand-
— Sehun, cadê a porra do papel?! — Chanyeol perguntou num grito, de braços cruzados, e ganhou um tapa de Jongdae e Yeri, que esperavam pacientemente pela continuidade da conversa.
— Já vou te dar, arrombado. — rosnou, bravo em sua direção, e logo voltou a sorrir gentil para Junmyeon, que segurava uma risada.
— É, vai lá, vai. Chega de flerte. — Minseok gesticulou com a mão para que ele voltasse para sua mesa, enquanto os dois sentiram o rosto esquentar automaticamente.
Sorriram um para o outro antes de se despedirem, e Sehun voltou para a mesa completamente furioso de Chanyeol ter interrompido tudo. Simplesmente jogou os papéis na mesa e deixou que eles pegassem por si só. Os dois competitivos acabaram nem se importando, já estavam com a caneta na mão, apenas preencheram o formulário com toda a pressa do mundo, como se completar primeiro fosse fazer diferença para o resultado final.
Enquanto eles dois estavam ali, Sehun se sentia frustrado porque havia acontecido o mesmo de sempre: toda a vez que estava prestes a chamar Junmyeon para sair, sempre travava, algo acontecia, o mundo acabava… Sentia que daquele jeito nunca conseguiria demonstrar o quanto gostava daquele rapaz de sorriso fácil, que lhe tirava o fôlego a cada olhar trocado e que, mesmo sem ele saber, esperava de alguma demonstração dele para tomar iniciativa. Junmyeon, apesar de também gostar de Sehun, era tão tímido quanto e muitas vezes não conseguia acreditar em suas investidas, sempre pensado que era brincadeira ou coisa de sua cabeça imaginar o capitão do time de basquete gostando de si. Os dois suspiraram frustrados sem verem um ao outro, um em cada mesa. Junmyeon ganhou um afago de Minseok em seus cabelos, enquanto Sehun ganhava um abraço de Yeri.
Quando os dois competitivos terminaram de preencher o formulário pequeno, quase ao mesmo tempo, levantaram correndo dos bancos, fazendo o arrastar dele um baque estrondoso pelo refeitório que chamou a atenção de todos. Dois marmanjos de dezessete anos corriam para a mesa do lado com o papel em mãos, praticamente os jogando na cara de Baekhyun, que chegou não muito tempo depois.
— Mal posso esperar a hora para fazer a audição — Jongdae comentou, e o outro deu um risinho como resposta.
— Eu também. Não pensei que você iria se inscrever.
— É, eu… decidi de última hora, achei que seria interessante tentar.
— Foi uma boa surpresa. Bem… Boa sorte! — sorriu e Jongdae quase se derreteu com aquele sorriso galante, enquanto o mais alto parecia ficar vermelho de raiva.
— Mal posso esperar para a audição. — Chanyeol comentou, ciumento dos elogios.
— É. — Baekhyun disse quase inexpressivo, justamente por achar chato esse jeito metido de Chanyeol, que levou aquilo como uma implicância.
Os dois, depois daquele momento, voltaram a se sentar na mesa, onde Sehun e Yeri haviam terminado de almoçar depois de toda baboseira competitiva — que ao menos serviu para Yeri roubar um pouco de frango do prato de cada um.
A frase “é uma boa surpresa” não saía da mente de nenhum dos dois. Jongdae, porque realmente admirava Baekhyun e aquilo o pegou de surpresa também — e porque tinha um resquício de crush nele. Mesmo reconhecendo seu próprio talento, via-se como um zero à esquerda naquele clube e um elogio como aquele significava que provavelmente ganhou alguns pontinhos com o Byun. Chanyeol estava era furioso, porque se Jongdae ganhava uns pontinhos, queria dizer que ele estava à frente. Estando a frente, queria dizer que precisava se recuperar para ganhar aquela competição. Não, não iria deixar aquilo barato de jeito nenhum.
E não deixou.
Se Chanyeol já era barulhento e exibido em seu estado normal, imagina em sua forma competitiva? Ah… era pior ainda. Mesmo tendo realmente o título de um dos melhores guitarristas do clube de música, queria ser o melhor guitarrista para a CBX e queria que Baekhyun visse isso.
E isso refletia em todas as suas ações. Por exemplo, como no dia que puxou briga depois de um dos ensaios de técnicas. Jongdae, desde que decidiu entrar para a CBX, começou a voltar a praticar violão, pois sabia que aquilo seria mais apreciado pelos membros que apenas seu teclado, pois era o instrumento tocado pelo antigo membro, Changmin. Sabia que não era o melhor guitarrista do mundo, todavia treinava Sunday Morning do Maroon 5 somado à habilidade de tocar e cantar ao mesmo tempo desde que decidiu sua música. Chanyeol, por sua vez, era um ótimo guitarrista, porém precisava de mais técnica para não desgastar tanto as cordas vocais ao cantar. Para “somar” ao currículo, era um ótimo provocador, achava que aquela implicância infundada que adorava fazer com Jongdae iria o ajudar a passar sua frente.
Então toda a vez que ele errava uma nota, dava uma risadinha, ou perguntava “Você não quis dizer…” e tocava o acorde correto. Ah... mas isso deu uma briga... Se tinha uma coisa que Jongdae odiava, era duvidar e zoar de sua capacidade, sendo que sabia ser muito talentoso. A cada correção ficava cada vez mais irritado, cada vez mais se segurando, até decidir se dar por vencido. Ficou apenas esperando Chanyeol começar a tocar para treinar seu canto, pois sabia que ele não poderia corrigir. Um acorde, um falsete em uma hora inesperada e o resultado era o Park todo desconsertado, desconcentrado com a voz de Jongdae. Então, aos poucos, os dois começaram a ficar pilhados, irritados, furiosos, e a briga indireta se tornou tão barulhenta com Sunday Morning e Creep sendo tocadas — ou melhor, gritadas — ao mesmo tempo. A única pessoa que conseguiu parar aquilo foi Yeri com um berro mais alto ainda, assustando até o Sehun que os esperava na porta e o Baekhyun dentro da sala, olhando-os desapontado.
E mesmo com o aviso dos amigos, eles não conseguiam parar de brigar. Passaram as semanas daquele jeito, brigando aqui e acolá para ver quem era o melhor, naquela competição quase doentia que parecia não ter fim. Um dia desses, foram pegos brigando no refeitório para ver qual era a música mais cheia de significados. Jongdae defendia que Sunday Morning, da Maroon 5, era a mais bonita por conseguir trazer uma boa narrativa de romance naquela melodia tão cativante e alegre. Enquanto Chanyeol defendia que Creep, da Radiohead, era a melhor porque nem sempre é fácil trazer melancolia para uma música e a banda conseguiu trazer toda essa carga emocional com sucesso. Passaram uma tarde inteira brigando por causa disso, e nem o olhar desgostoso — quase feroz — de Minseok adiantou.
Os dias se passavam lentos demais para Sehun e Yeri, que só esperavam a audição chegar logo para aqueles dois pararem de brigar. O tempo se mostrou um pouco mais gentil e os pedidos desesperados foram atendidos, o dia de mostrarem seus talentos finalmente chegou e com ele toda a tensão para dar seu melhor. Não teriam para onde fugir e o que provocar. Era a hora de botar em prática tudo o que treinaram e discutiram para provar como eram os melhores.
O dia da audição amanheceu nublado, talvez adivinhando que vários jovens ficariam na fila para a audição em direção a garagem da família Kim e fazendo curva em sua rua de tanta gente. Sehun e Yeri, a pedido dos dois, os acompanharam durante a fila com um par de banquinhos dobráveis, não queriam ficar em pé esperando por uma coisa que não era seu assunto. Quanto mais próximo da porta da garagem da casa amarela, mais o coração dos dois palpitava. Chanyeol suava frio, e Jongdae estava quase ficando sem ar. Além de fazer bonito na frente deles, não queriam de jeito nenhum perder aquela aposta. Para eles, esfregar sua vitória na cara dos outros era mais valioso que talvez tocar com eles.
Quando sobravam apenas umas sete pessoas na frente da dupla competitiva, puderam ver alguém sentadinho em uma cadeira de madeira recepcionando os participantes na entrada. Junmyeon com seus sorrisos acalmava o coração de qualquer um que estivesse prestes se apresentar, e em contrapartida agitava o coração de Sehun, que sequer tinha pretensão de participar da audição. Quando o viram ali, logo começaram a o cutucar para que tentasse puxar assunto, porém o altão não tomava coragem por pensar que iria atrapalhar seu trabalho. Depois de tanta insistência, o Kim mais novo pareceu ouvir os pedidos dos amigos e percebeu a presença do jogador de basquete, abrindo um sorriso maior ainda.
— Sehun! Você disse que não iria participar das audições... — brincou com um sorriso no rosto, e o Oh pôde sentir suas pernas tremerem no lugar.
— Não eu... É... Não vou não. Eu só estou para torcer pelo Dae... — ganhou um olhar fuzilador de Chanyeol. — E pelo Chanyeol também.
— Não sabia que levava jeito para líder de torcida. Apareça no nosso treino um dia desses! — brincou de novo, e só o Sehun não percebia o clima ali com aquelas brincadeirinhas bobas, cheias de segundas intenções. Junmyeon mal sabia que o mais alto comparecia a todos aqueles treinos religiosamente, seja fingindo treinar após o horário, seja espiando pela fresta da porta do ginásio.
— Ah, não é para tanto... — riu sem graça e ele não conseguiu dar continuidade à conversa de tão nervoso. Ficaram novamente só trocando olhares e sorrisos bobos, sem sequer uma palavra trocada. Até que Yeri se cansou daquilo e soltou:
— Junmyeon, o Sehun queria te perguntar uma coisa — sorriu travessa, dando tapinhas nas costas do primo. — Vai lá, vai. Pergunta aí.
— Eu queria... Queria saber... — sorriu meio nervoso, todo travado no mesmo lugar, em contraste com o sorriso esperançoso do líder de torcida. — Queria saber se você não quer sair daí. — disse de uma vez só para tirar logo aquela frase da cabeça, mas só notou que falou besteira depois de ouvir os três amigos baterem a mão na própria testa.
— Por que? É que eu não posso sair daqui, eu prometi ao Seok que iria cuidar das fichas de todos e... — respondeu meio confuso.
— Não... Não é daí. Era para eu perguntar se você quer... Uh... Quer sair comigo — até fechou os olhos com medo da resposta de Junmyeon, que também estava bem nervoso com a pergunta.
— É claro que quero! — disse ainda mais animado, abrindo um sorriso radiante. Esperava por aquele convite há um bom tempo e, por não ter muita coragem de tomar atitude, preferiu esperar por ele. Não foi uma ideia tão boa assim, já que ele parecia nunca entender seus sinais e indiretas, nem mesmo os sorrisos direcionados para si.
— De verdade? — Sehun ainda parecia zonzo com aquela resposta, não esperava que ele ficaria tão ansioso. Na verdade, sequer esperava um “sim”.
— Claro! Podemos ir depois que as audições acabarem. Tenho uma lanchonete que queria te levar, acho que você vai gostar das vitaminas de lá — o Kim disse todo animado, ansioso por aquele encontro.
Sehun, tadinho, estava tão confuso e feliz com aquele “sim” que sequer sabia o que fazia além de assentir a cabeça. Os outros três estavam todos felizes batendo palminhas, contagiando até quem estava próximo deles na fila. Ver eles dois finalmente saindo juntos era uma vitória para quem os aguentava ouvir falando tão bem um do outro, mas que fugiam na hora de tomar atitude. Agora, finalmente sairiam juntos, conheceriam melhor seus gostos e compartilhariam momentos juntos além de espiadas pelas frestas do ginásio.
Mesmo com toda aquela felicidade, a hora da audição não tardou a bater na porta, e o nome de Jongdae, que foi o primeiro a chegar, foi chamado para dentro da garagem. Ele estava nervoso, porém se sentiu um pouco mais tranquilo com o encorajamento e torcida de Junmyeon, seguido de Baekhyun tão ansioso para ouvir-lhe cantar. Aquilo surtiu um efeito reverso, deixando-o ainda pior, não queria ir mal na frente dele. Logo o Byun, um dos caras mais populares e legais da do colégio, alguém que admirava há bons anos desde que entrou no clube de música. Mas respirou fundo, sentou-se no banquinho disponível ali e desencapou seu violão para começar a cantar Sunday Morning para os dois jurados atrás de duas mesas de plástico fazendo anotações.
Assim que terminou, foi aplaudido e entrou Chanyeol, emburrado por ouvi-lo ir tão bem. Transparecer como tinha gostado era a última coisa que queria. Não estava muito nervoso, gostava do frio da barriga antes de se apresentar para alguém, e o amor por mostrar sua música e sua arte para os outros sem nem pensar duas vezes o estimulava a não se preocupar com perfeccionismo. Queria arrancar aplausos e sorrisos — na verdade, lágrimas — deles, apenas isso. Quando começou a tocar o início de Creep, Minseok levantou os olhos do papel ao ver sua habilidade no dedilhado, realmente impressionado. Apesar de fazerem as mesmas aulas extraclasse, nem sempre prestava muita atenção nele e quando prestava, era sempre o fuzilando o olhar por tocar ou falar alto de mais. Mereceu os aplausos ao final e o moreno saiu da garagem com um sorriso imenso, convencido de que tinha dado uma das melhores performances da sua vida. Coisa que Jongdae, do lado de fora, até que concordava um pouquinho.
Então, soltaram todo o ar que estava preso. Afinal, acabou aquela fase e agora tudo o que precisavam era esperar o destino, a hora certa do resultado chegar.
…
Na semana seguinte, após o fim da última aula de sexta-feira, um aglomerado de alunos podia ser visto no pátio da escola, rodeando uma grande árvore do pátio com bancos a cercando. Em cima de um deles, estava Minseok e Baekhyun com alguns papéis em mãos.
— Olá! Oi! Nós vamos divulgar o resultado da audição agora! — o Byun disse animado, mas as dezenas de pessoas em volta pareciam não escutar com toda aquela conversa paralela e isso os deixava sem paciência, era a terceira vez que tentavam chamar sua atenção.
— Silêncio! — gritou ríspido e todos se calaram na hora. Não tinha um ali que não tivesse medo de seu olhar furioso. — Continua, Baek.
— Enfim, ficamos vários dias pensando em quem deveríamos chamar. Analisamos vários fatores como harmonização, afinação, técnicas mostradas... Coisas importantes para que o novo membro não precisasse adaptar muito para combinar com o estilo que já temos.
— Além de disponibilidade de horários, claro. Porque assim ficaria mais fácil de marcarmos os ensaios da banda. — Minseok completou e o outro fez que sim com a cabeça.
— Depois de quase quarenta fichas avaliadas, conseguimos finalmente escolher quem deve entrar na banda conosco. Foi uma decisão bem difícil, mas ela já está feita. — riu levemente nervoso.
Chanyeol e Chen, no meio daqueles vários estudantes, tremiam de nervosismo. Era agora a hora de saber quem ganharia ou não, a hora de saber quem entraria para a banda e quem seria zoado até o fim por perder a aposta, a hora de saber quem era o melhor. Um deu um olhar levemente ameaçador ao outro, sentindo o estômago revirar quando Baekhyun pigarreou para dar o resultado.
— A pessoa que escolhemos foi... — Baekhyun fez uma pausa dramática, deixando todos os outros numa onda de nervosismo. — Foi... Kim Chungha! Meus parabéns!
— Chungha? — os dois disseram boquiabertos ao mesmo tempo, tendo todas as suas expectativas caindo por terra. A menina dava pulinhos de felicidade e teve o caminho aberto dentre as pessoas para abraçar os dois novos companheiros de equipe, que a parabenizavam pelo resultado.
Então queria dizer que o C de CBX não seria de Chanyeol, nem de Chen. Seria de Chungha, a menina que parecia sempre insegura e que deixou todo o mundo boquiaberto com sua habilidade na guitarra — sem contar com baixo, flauta doce, teclado e até bateria. E agora? Se nenhum dos dois ganharam, quem foi o vencedor? Como é que ficariam suas apresentações que imaginaram e tanto sonharam para o seu último Show de Talentos na escola? Tinha algo errado ali e eles não iriam deixar barato, diferente de todos os outros que mesmo frustrados, aceitaram o resultado de bom grado. Claro, tratava-se de Chungha, uma pessoa realmente talentosa que iria inovar naquela banda por ser a primeira voz feminina. Seria algo novo e empolgante de se ver, menos para os dois competitivos, que correram para frente do banco de concreto onde estavam em pé para reivindicar seus resultados.
— Por que eu não ganhei? — Jongdae perguntou primeiro, os cenhos franzidos expressavam o quão furioso estava.
— Não, não. Por que eu não ganhei? Eu toco muito melhor que ela, vocês não viram na audição? — Chanyeol perguntou com o rosto avermelhado de tão bravo.
— E eu? Eu canto bem melhor que esses dois! Por que, hein?
Minseok bufou impaciente, indicando com um gesto para que Baekhyun tentasse explicar. Deveria ter ouvido o Kim, pois ele realmente disse que iria acontecer algo como aquilo com os dois competitivos.
— Por favor, se acalmem. Vou explicar, mas não ajam como se a vitória dela fosse injusta. — Baekhyun tentou tranquilizar os ânimos dos dois estressadinhos prestes a voar em cima deles de tanta raiva por não cumprirem com suas expectativas.
— E nem ajam como se eu não merecesse, porque eu fui muito bem na audição, canto muito bem e toco vários e vários instrumentos. Aceitem que perderam. — Chungha ditou impaciente. Sabia daquela competição toda, todavia odiava como eles invalidavam todo treino e trabalho que teve por causa de uma vaga na banda que não era para ser deles.
— Tá, tá. Mas pelo menos admitam que eu fui muito melhor que o Jongdae. — Chanyeol disse impassível, cruzando os braços e rindo da expressão inconformada do menor.
— Hah, duvido muito. Eu tenho certeza que fui muito melhor.
— Vocês foram bem. Claro que cada um tem seus defeitos, mas vocês foram igualmente ótimos. O problema é que... — continuou antes que eles perguntassem o motivo. — Vocês são pessoas meio difíceis de lidar. E...
— Vocês são dois pau no cu. É isso — Minseok completou, vendo que Baek não conseguiria completar e ser duro como precisava naquele momento. — Nós não iríamos aguentar nenhum de vocês dois na nossa banda porque vocês não param de brigar! Imagina só, escolhemos uma música para apresentar e um de vocês discorda. Ou, ou... Decidimos que um de nós será o centro da apresentação e você não concorda em ser “deixado de lado” para quem realmente combina com a canção brilhar — gesticulava de forma rude de tão estressado, tão necessitado de botar tudo aquilo para fora. — Se não passaram, a culpa é inteiramente de vocês.
— Eu mesma pensei que um de vocês iria ganhar, todo o mundo do Clube da Música sabe como vocês cantam e tocam bem. — Chungha comentou, sem saber muito bem o que dizer.
— Mas convivência em grupo também conta muito para se ter uma banda, então... O resultado já está dado. É realmente uma pena, porque eu gosto muito de vocês. — suspirou meio inseguro da reação deles.
— Enfim, mais alguma dúvida ou vão querer levar mais um fora? — Minseok perguntou grosseiro, levando um beliscão de Baekhyun para que ele parasse de agir daquela forma.
Os dois, ainda sem reação, apenas disseram “não” maquinalmente e foram andando lado a lado para longe da árvore. Milhares de pensamentos passavam por aquelas cabeças que antes importavam-se apenas em ser o melhor e vencer, e agora que o impulso da competição passou, não restou nada. Quando ficavam muito imersos em uma competição, voltar a pensar em outras coisas e superar que acabaram sem o primeiro lugar era difícil para eles. Digerir que os próprios tinham estragado a chance perfeita para estrear e mostrar seus talentos era doloroso, porque culpar o outro era sempre mais leve que sentir o peso da culpa em suas costas. Mas não havia o que fazer, CBX arranjou um novo C e ele não era nenhum deles.
Jongdae estava arrasado, não conseguia acreditar que entrou de novo na onda competitiva de Chanyeol e destruiu aquela oportunidade perfeita de fazer uma ótima apresentação no Show de Talentos por causa de uma bobeira dessas. Estava se sentindo tão, tão infantil e agora várias e várias cenas deles dois brigando nos últimos dias pareciam ridículas em sua mente. Ainda ao perceber como faziam na frente de todos, principalmente de Baekhyun e Minseok... Estava frustrado consigo mesmo e essa era uma sensação terrível.
Por outro lado, Chanyeol estava furioso. Para ele, um empate significava uma derrota também e odiava perder, odiava sentir-se inferior, que não era o melhor. Mais especificamente, que não era melhor que Baekhyun. Aquela peste tinha tudo o que Chanyeol mais desejava: os holofotes pela música que tocava, o reconhecimento pela arte que produzia. Tinha um ódio terrível daquele baixinho de cabelos platinados e sorriso gentil que conquistava todo o mundo. Sabia que se entrasse na CBX iria brilhar tanto quanto ele, e só assim todos iriam ver como era bom, e era. No entanto aquela competição de novo o fez perder tudo, e perder tudo junto de Jongdae. Estava intocável e iria passar o dia todo de cara amarrada do jeito chato e infantil que tinha.
Ao longe, conseguia se sentir a aura negativa e pesada em volta deles, principalmente Sehun e Yeri, que sabiam que o resultado foi dado, mas ainda estavam tentando entender a expressão daqueles dois.
— E então? Quem passou para a CBX? — Yeri tomou coragem para perguntar quando chegaram mais perto, mesmo temendo aquela maré de mau humor.
— A... A Chungha. — Jongdae respondeu ainda incrédulo, saindo daquele transe, daquele vendaval de pensamentos em sua cabeça. — Nenhum de nós passou.
Os primos se olharam surpresos, entendendo parcialmente suas expressões, mas ainda tentando entender a escolha dos jurados. Para Yeri, ao menos um deles iria passar com todo aquele talento e com o tanto que estavam se esforçando. Sehun, no entanto, temia um resultado como aquele depois daquele comportamento competitivo em excesso. Entreolharam-se, e logo decidiram — como se conversassem telepaticamente depois de tanto tempo convivendo juntos — que deveriam perguntar algo.
— E o que aconteceu? Por que vocês estão com essa cara aí? — o Oh perguntou meio preocupado, já que Chanyeol bufava alto, parecia até ter corrido uma maratona, enquanto o olhar de Jongdae vagava indireto, sem conseguir os encarar.
A pergunta pareceu servir de gatilho para todo o estresse de Chanyeol ressurgir, mesmo com sua tentativa de conter as reações exageradas que sempre tinha na maioria dos casos.
— A culpa é do filho da puta do Jongdae, por que ainda perguntam? — Chanyeol voltou a gritar, e Sehun se arrependeu de perguntar.
— Minha? Qual é? A culpa é nossa! Nós dois ficamos brigando o mês inteiro e agora perdemos a vaga. Aceite. — Jongdae respondeu no mesmo nível, gritando e gesticulando estressado com aquele julgamento injusto e infantil.
— Por que a culpa seria minha? Você que me fez perder a vaga que eu tanto queria.
— Eu já disse que a culpa não é minha se você ama implicar comigo e não gosta quando eu devolvo na mesma moeda.
— Ah é? Ah é? E quem foi que começou com essa putaria toda? Porque eu não compito sozinho. Quando eu disse que ia me inscrever, você logo disse que queria também.
— E o que o cu tem a ver com as calças? Não posso mais me inscrever para as mesmas coisas se não o bebê Yeol chora de medinho de perder para mim — fez uma voz infantil só para implicar.
— Eu tô falando que você nem queria entrar pra banda e quis se meter comigo só pra implicar. Porque você sabia que eu iria me estressar e foder com tudo, não passar e aí você ficaria com a vaga.
— Olha, a parte dele não querer entrar na banda é verdade. — Yeri decidiu se meter na briga, tendo Chanyeol batendo palmas por achar que tinha alguém de seu lado. — Mas o Chen não iria tão longe numa competição dessas, ele nunca pensaria em fazer al-
— Pensaria, sim! E o melhor: Conseguiu. Hah, conseguiu! — riu sem graça alguma, bastante alterado. As pessoas a sua volta prestavam atenção naquela nova discussão, já estavam se acostumando em serem espectadores por conta de tanta briga naquele mês.
— Cara, você é muito emocionado. — Jongdae cruzou os braços, desanimado de continuar com aquela briga toda vendo como o outro era infantil. — Qual a porra do problema de eu querer competir com você? Entrar na mesma audição que você? Querer fazer você perder só porque você age como se eu fosse um merda que não sabe nem um acorde básico? Você fica cego na competição e a culpa é minha por você ser tão competitivo? Já perdemos, não somos membros do CBX, qual o problema de aceitar isso? Bola pra frente, inferno!
Chanyeol saiu emburrado, cansado de brigar e por não querer admitir que tinha passado dos limites de todas as maneiras possíveis, seja na competitividade, seja na discussão. O que os três amigos puderam fazer por ele? Deixá-lo sozinho, refletindo os próprios nos pensamentos sobre tudo o que fizera até agora.
...
Os dias seguiram assim: seguindo suas vidas normais, com aulas normais, comparecendo no clube da música sem sequer trocarem olhares, ou um cumprimento. Estavam bem frustrados com o resultado para falar a verdade, ainda mais em admitir que era consequência de seu comportamento infantil. Pior que isso, jogar fora as imagens de tudo o que não viveram com a banda era doloroso, principalmente as que imaginavam a apresentação de tirar o fôlego do Show de Talentos. Os aplausos, as parabenizações, os elogios dos professores, a adoração dos alunos e o prêmio, o tão sonhado prêmio... Tudo parecia tão distante agora, logo no que deveria fechar a vida escolar com chave de ouro. Agora, apenas poderiam lidar com a derrota e a única lembrança daquele terceirão seria o ano em que não participaram do Show de Talentos por deixarem a infantilidade subir à cabeça.
Isso não só incomodava os dois, mas também Yeri. Ela, por sempre gostar de colocar lenha na fogueira e achar graça daquelas brigas bobas, via-se como a culpada principal da tristeza deles. Sentia que se não tivesse brincado tanto, talvez os dois amigos ainda se falassem, e talvez até um deles estivesse na CBX. Além disso, a atenção que costumava vir de ambos ao mesmo tempo começou a ser dividida. Dificilmente via Chanyeol e Jongdae juntos conversando normalmente na mesa do refeitório e competindo para ver quem terminava a garrafa de água primeiro (e Chanyeol sempre ganhava, só para deixar claro). Parecia um dejavu da primeira vez em que os dois brigaram tão feio. E isso, felizmente, fez uma lâmpada se acender em sua mente. O motivo pelo qual estavam tão brigados continuava o mesmo de antes e agora sabia como resolver, sabia a raiz do problema. Só precisava contar para Sehun.
...
Enquanto isso, Sehun estava em seu primeiro encontro com Junmyeon. A audição terminou muito tarde naquele fim de semana e por conta do horário não conseguiram sair juntos para a lanchonete que tanto queriam. Os horários apertaram, os treinos mais intensivos vieram para Junmyeon e Sehun não estava com muita cabeça para encontros depois do resultado das audições. Precisaram adiar por uma semana.
Mas não fazia diferença, aquele tempo de espera apenas fez os corações bobos palpitarem mais de ansiedade e saudades, mesmo que continuassem com a mania de um espiar o treino do outro. No fim, quando não se aguentavam mais de esperar a data certa, Junmyeon o convidou de surpresa para tomar alguma vitamina em uma lanchonete próxima do colégio depois do treino. E lá estavam eles, com a troca de roupa amassada por guardarem enroladas nas mochilas e ainda molhados do banho no vestiário, sentados na mesa mais próxima da vitrine, podendo ver o movimento calmo da rua naquele horário.
A conversa, mesmo tímida, ia e vinha. Contavam sobre seus dias enquanto as vitaminas não chegavam, e, quando chegaram, comidas preferidas virou o assunto principal. E claro, o ódio de Sehun por abacate também foi jogado na roda, até porque, Junmyeon fez questão de pedir um copão de vitamina daquele sabor. O papo estava bom, o problema é que o maior parecia evasivo e avoado naquele dia tão especial e o outro não tardou a perceber como parava com o assunto no meio sem querer, como se perdesse o fio de raciocínio entre tantos pensamentos. Junmyeon, preocupado, tentou resolver esse empecilho.
— Hun, tá tudo bem? — o Kim perguntou inclinando a cabeça até que seu olhar se encontrasse com o semelhante, desviado. Ele acordou num pequeno susto e balançou a cabeça vagarosamente.
— Eu tô... É só... Sei lá — o Oh tentou desconversar para evitar preocupações, o que não adiantou muito.
— Pode falar, não tem problema — sorriu gentil.
— É que eu não quero foder com o clima do encontro com umas coisas bobas assim...
— Não vai foder nada, de verdade. Pode contar! Eu só não quero te ver com essa carinha assim... — E apertou as bochechas do maior formando um biquinho, que se desfez com a risada gostosa de Sehun. É, estava realmente apaixonado.
— Já que insiste... — ajeitou-se na cadeira ao ver que não tinha jeito. Os olhinhos curiosos e ansiosos os esperavam por uma explicação. — É aquela história do Yeol e do Dae... Esses dois idiotas brigaram de novo e isso tá acabando comigo. Você sabe, o novo C do CBX é a ChungHa e eles não conseguem aceitar, ainda mais porque tinha uma competição no meio para ver quem iria entrar. Mas depois disso eles não estão mais se falando, e ter que conversar com eles individualmente é muito ruim. — bufou, tomando mais um gole da vitamina de banana. — Ainda mais porque desse jeito, o único assunto é como o Chanyeol é um infantil, ou como o Jongdae é um traíra. Ugh, isso me tira do sério, é como se a porra do meu grupo de amigos não existisse mais.
— Entendo... No grupo dos líderes de torcida isso costuma acontecer com frequência, então estou até acostumado. Acho que a melhor solução é sempre encontrar a raiz do problema e, se você sabe por que eles brigaram, é um adianto.
— O problema é que eles são competitivos mesmo, é normal eles fazerem isso com tudo. Uma vez eles até botaram eu e a Yeri para julgar quem conseguia imitar melhor um galão de água borbulhando, para você ter noção — E Junmyeon quase se engasgou com a vitamina de tanto rir imaginando aquela competição acirrada. — Só que dessa vez eles realmente pararam de se falar faz... Uma semana. Deve ter algo por trás.
— Com certeza... — constatou enquanto balançava a cabeça fazendo que sim, pensando um pouco sobre a relação deles. — Quem geralmente começa a competição?
Sehun parou um tempo para pensar, fazendo um apanhado geral das milhares de brigas bobas que compunham aquela amizade até chegar a uma resposta.
— Todas as vezes quem começa é o Chanyeol porque o Dae implica com ele por algum motivo.
— E o Dae é implicante com todo o mundo? — Junmyeon perguntava com os cotovelos apoiados na mesa, que suportavam seu queixo encostado nas mãos. Sentia-se em uma terapia de casal, indireta, no entanto.
— Muito! Mas ele é brincalhão assim mesmo — riu.
— E o Chanyeol?
— Ele é bem competitivo e sempre quer ser o melhor em tudo, é natural dele. Mas de brigar, eu vejo ele fazer isso mais com o Jongdae.
— Então se você quer pegar na raiz do problema, vai ter que falar com o Chanyeol. — concluiu depois de montar uma linha de raciocínio com algumas várias situações do que poderia ser o motivo. Algo impreciso como não era íntimo de nenhum dos dois — Ele parece ter algum pequeno problema com o Jongdae, mesmo que nenhum de vocês admita, ou sequer enxergue.
Foi então que um turbilhão de pensamentos invadiu a cabeça de Sehun, como se estivesse revivendo todos aqueles momentos. Junmyeon realmente estava certo, e aquela linha de raciocínio só o levava até um momento: o primeiro ano do Ensino Médio. Só podia ser isso.
No entanto, logo que teve essa pequena resolução em sua mente, fez questão de deixar em segundo plano. Não queria ficar pensando em problema dos seus amigos quando se estava tomando vitamina com o líder de torcida mais lindo de todo o colégio.
...
Mais tarde, no prédio dos Oh, Sehun subia as escadas apressadamente. Desde que veio morar na Coreia depois de anos estudando nos Estados Unidos, dividia o pequeno apartamento com os tios e felizmente nunca teve problemas de convivência ali — tirando o fato do prédio ser antigo e barato, ou seja, não tinha elevador.
Sentia que se não fosse mais rápido, o fio da meada iria se escapar e iria esquecer de todas as descobertas feitas no dia. Não, não era só sobre a boca de Junmyeon ser mais macia do que imaginou, e que vitamina de abacate soava um pouco menos detestável quando a sentiu nos lábios dele. Era algo que veio na sua cabeça depois da conversa sobre os amigos brigados. E ficou apitando, indo e voltando, e não pararia até que conversasse com a prima, exatamente no mesmo estado. A menina treinava teclado naquele anoitecer, na tentativa de lembrar como tocar Ave Maria com maestria, pois era uma das melodias que mais gostou de aprender. No entanto, as notas foram tocadas de uma vez só de forma brusca assim que Sehun apareceu na porta, empurrando-a com força, afobado. E do jeito que o conhecia bem, sabia que vinha fofoca. Precisou parar com o treino pelo menos por agora.
— Yeri, eu descobri uma coisa — o Oh disse ofegante, tirando as pantufas e se jogando na cama macia. — O Chanyeol mentiu pra gente o tempo todo!
Ela apertou novamente todas as teclas ao passo que levantava os cenhos, virou-se depressa no banquinho para o olhar surpresa, entendendo do que se tratava. Naquele momento, nunca se sentiu tão feliz de ter a mente quase conectada com a dele. Era uma sincronia de família.
— Eu sabia que não estava ficando maluca! Esse safado ainda gosta do Chen! — concluiu eufórica e ficaram se encarando surpresos digerindo a informação compartilhada, como se realmente estivessem conectados. — Foi por isso que eles brigaram, não é?
— Com certeza. Essa é a única explicação, esses putos não são de brigar assim. — foi se ajeitando na cama, de barriga para cima, e a mais nova deitou logo a seu lado, observando o teto cor de pêssego do quarto.
— Ok, vamos recapitular. Tudo começou no primeiro ano, certo?
— Certo. — fez que sim com a cabeça, determinado. — Foi a primeira vez que Chanyeol e Jongdae estudaram na mesma sala porque a turma C foi dissolvida quando acabou o nono ano. Foi aí que o Chanyeol começou a andar com a gente, confere?
— Confere! — disse animada, vendo aquelas lembranças nítidas como se tudo ocorresse ontem. — Naquela época, o Yeol começou a gostar do Chen assim que bateu os olhos no dele. É um verdadeiro emocionado, né? — E os dois riram por ele esconder naquele corpo grandão e cara amarrada um coração tão mole. — Mas... Ele nunca correspondeu, porque, na verdade, sempre teve um crush no Baek.
— Isso! O Chanyeol sempre soube disso, não foi? — E a garota concordou com a cabeça. — Então faz sentido ele não suportar o Byun, apesar de ser um motivo ridiculamente infantil.
— Bota infantil nisso... — estalou a língua no céu da boca em descontentamento. — E se parar para pensar... Quem é o B da CBX?
— Exato! — Sehun respondeu a pergunta em sua mente. — O Chanyeol já compete a atenção do Dae com o Baek, imagina tendo a oportunidade de entrar na banda e competir isso diretamente? Pff... Nem ele queria realmente estar naquela banda. — negou com a cabeça, desapontado. — Enfim, sabe o que precisamos fazer, certo?
— Temos que dar dois tapas nas ‘zoreias dele, pra ele ficar esperto e ver se cresce! — concluiu animada, ansiosa para aquele momento.
— Não! Porra, garota, você tá ficando muito violenta. — deu um empurrãozinho na prima, que calhou de rir. — Temos que conversar com ele numa boa, ver se ele coloca a cabeça no lugar.
— Tudo bem. Então amanhã sem falta! — ergueu o punho fechado, só esperando que o Sehun correspondesse o “toque dos primos”.
— Isso aí! Vamos reunir nosso grupo de novo. — bateu no punho dela de levinho, para concretizar aquela meta.
Pela conversa tão objetiva, parecia até fácil juntar eles dois de novo. Todavia esqueceram de um detalhe bem importante: estavam lidando com duas pessoas que não eram eles. Duas pessoas que tinham pensamentos distintos, que poderiam muito bem reagir diferente do que eles esperavam, eram inconstantes. Lidar com sentimentos sempre era uma caixinha de surpresas, ainda mais envolvendo algo tão delicado como um passado mal resolvido. No entanto, não aguentavam mais passar os dias com os amigos brigados, então mesmo que estivessem frustrados com tantas tentativas falhas, não iriam medir esforços para ver o grupo junto novamente.
E isso não era um desejo só de Sehun e Yeri. Jongdae no fundo no fundo desejava que os velhos tempos voltassem, assim poderia falar com os quatro juntos. Depois daquela discussão, continuava se sentindo culpado pela derrota dos dois, pela discussão toda, mesmo sabendo que parte daquela confusão foi causada pelo Chanyeol e seu orgulho frágil. Não diria que o perdoaria fácil pelo drama e o fim de seu grupo de amigos, porque tinha certeza que ele precisava de uma boa bronca para aprender a amadurecer.
Para falar a verdade, o dito cujo também percebeu que passou dos limites e foi infantil de mais, mas quem disse que daria o braço a torcer? O agora “lobo solitário” a cada nota lembrava de como brigou, a cada acorde lembrava daquelas palavras duras e seu sentimento de culpa ia o corroendo por dentro, porém não conseguia pedir desculpas. Estava ferido e triste, não só por não passar nas audições e estragar seus próprios planos de apresentação em grupo, mas por ser o causador da distância entre seus amigos mais fiéis e de quem tanto ainda amava. Chanyeol se sentia definitivamente um idiota, o pior deles. Ao invés de conversar e tentar resolver, isolava-se como se fosse a solução de seus problemas e magicamente tudo se resolveria se não estivesse por perto.
A situação era tão incomum que não passava despercebida pelos olhos dos outros alunos, era costumeiro ver o quarteto sempre junto. Isso incluía Junmyeon, que apesar de só agora estar se enturmando com eles, tinha uma mania terrível de tomar as dores para si e levar os problemas dos outros para casa. Desde que se encontrou com Sehun, pensava em algum conselho para mudar aquela situação. Queria vê-los felizes de novo, principalmente Sehun. Por isso, ao sentar com os primos no almoço, tomou iniciativa de puxar assunto sobre a briga e, mesmo que as respostas fossem curtas, insistia delicadamente para continuarem a conversar sobre aquilo, até conseguir introduzir seus pensamentos.
— Eu acho que tenho uma solução para o problema de vocês — chamou a atenção de ambos que se acabavam com a sopa de legumes. — Sabe, quando eu era pequeno e brigava com o Seok, minha mãe pegava uma das camisas gigantes do papai e vestia em nós dois ao mesmo tempo. Era a “Camisa da Reconciliação”, e ficávamos presos dentro dela até que um pedisse desculpas para o outro. — Junmyeon explicou tranquilamente.
— Então temos que prender os dois bobões dentro de alguma camisa minha? — Sehun perguntou tentando entender o raciocínio.
— Não exatamente. É só uma metáfora, porque essa camisa pode ser qualquer coisa que os mantenha juntos por um tempo a sós.
— Como... A sala do Clube da Música? — Yeri sugeriu, logo ganhando a aprovação dos outros dois por ter traduzido aquela ideia. — Só precisamos fazer de um jeito que eles não percebam que estão sendo forçados a ficar juntos...
Os amigos começaram a olhar para pontos aleatórios para formularem planos concretos de como os atrair para o Clube de Música de forma natural. Na hora, deduziram que a aula normal cumpriria esse papel, só precisavam de uma forma de despistar os outros alunos. Em seguida, Sehun teve a ideia de fingir cancelar o encontro no Clube da música com os alunos, mentir que a sala estaria em manutenção por conta de um vazamento e os avisar individualmente, garantindo que nenhum deles espalhasse essa notícia por aí. Os que insistissem em ir, Yeri poderia barrar na porta, antes mesmo de entrarem.
Agora era só torcer para dar tudo certo no dia.
...
A quarta feira não tardou em chegar e o quase casal estava ansioso com o desempenho de Yeri naquela única tentativa de unir os dois brigões de novo. A morena, na noite anterior, mandou uma mensagem para cada um dos membros do Clube explicando o que aconteceu com a sala, pedindo encarecidamente que não repassassem a mensagem, pois ela mesma já fazia esse trabalho. Enquanto isso, os outros dois usavam de sua melhor lábia para convencer o zelador já meio surdinho a lhes emprestar a placa de manutenção para colocar na porta da tal sala, com uma autorização falsa do professor que Junmyeon, com aquela caligrafia impecável, conseguiu falsificar. Depois era só devolver dizendo que foi pedido por engano, era por um bem maior!
Primeira parte, feita. Agora vinha a maior preocupação deles: lidar com eles diretamente. Jongdae continuava próximo — quando o Park não estava com eles —, então não seria difícil conduzi-lo a sala. Sempre iam para lá juntos, não foi um problema. Chanyeol era o mais inconstante e sumido, então precisavam contar com a sorte.
Mesmo assim, Yeri garantiu de deixar tudo preparado para sua chegada: pediu para que Sehun discretamente esbarrasse com ele pelo colégio no horário das aulas extraclasses para lembra-lo do Clube de Música. Além disso, garantiu que Jongdae chegasse primeiro na sala e se sentasse ao lado dela nas cadeiras no fim da sala, no lado esquerdo. Quando Chanyeol entrasse, não iria notar sua presença por conta da direção em que a porta abria. Então, pôs fones de ouvido no Kim, pediu-o para ver alguns vídeos de covers no piano gravados pela menina e, por saber que ele ficaria silencioso naquela atividade, correu para o banheiro por conta de “emergências femininas”. Foi o suficiente para Chanyeol entrar com seu violão nas costas, emburrado por aparentemente ser o primeiro a chegar e ter que esperar mais tempo por seus outros amigos.
Quando o viram entrar, Junmyeon pregou a placa de manutenção na porta para garantir que ninguém entrasse, e Yeri continuou de tocaia para impedir algum curioso de insistir em ver o estado da sala. Pronto, ao menos os colocaram na Camisa da Reconciliação e o trabalho do trio estava feito.
Porém, se passaram uns dez minutos e sequer perceberam que não estavam sozinhos ali na sala iluminada apenas pela luz do sol que passava suavemente pelas grandes janelas. Chanyeol parecia bem entretido em afinar seu violão e dedilhar o início de Starway to Heaven, de Led Zeppelin enquanto Jongdae observava atentamente os covers da amiga para fazer algumas críticas construtivas sobre a gravação — que propositalmente estava porca, pois sabia como o Kim era crítico. Só perceberam quando Jongdae, para ajeitar sua postura, acabou arrastando a carteira no chão e os dois deram um pulo no mesmo lugar ao verem um ao outro ali, logo quem menos queriam encontrar.
— Oi, sumido. Quanto tempo. — O Kim alfinetou num tom beirando a deboche, do jeito que sempre gostou.
No entanto, já previa que Chanyeol iria tentar ignorar. Voltou a tocar violão e fingiu que aquele simples “oi” não o mexeu por inteiro. Em sua cabeça, analisava quais eram as chances de, de todos os membros do Clube da Música, justamente o Jongdae iria chegar cedo para o treino. E apenas ele. O que é que aconteceu com todo o mundo? Marcaram paredão e não soube? Todos aqueles pensamentos turvos o faziam errar aqueles acordes que sabia de cor, e isso o estressava a ponto de dedilhar as cordas mais rápido, mais rápido, mais rápido...
— Tá querendo arrancar o dedo fora, cara? — comentou com os ouvidos doendo de tão alto que ele tocava, fazendo a música ficar distorcida e desafinada. Ao parar, percebeu que Jongdae estava sentado à sua frente, no outro lado da sala.
— Estou tentando ensaiar, você me permite? — Chanyeol faltou rosnar enquanto batia na madeira do violão. Respirou fundo, recompondo-se, e voltou a tentar tocar novamente.
— Eu também estou tentando ensaiar, mas você me desconcentrou. — apontou para o teclado elétrico qual estava a sua frente, tentando encontrar a configuração que costumava usar enquanto pensava em alguma música para tocar.
— Vem cá, você vai ficar implicando comigo assim mesmo?
— Assim como? — perguntou cínico, segurando-se para não rir.
— Assim como você sempre faz, ué — bufou. — Não esqueça que foi você que começou com tudo.
— Tudo o quê?
— O rolê da banda — E foi a vez de Jongdae resmungar, quase revirando os olhos.
— Vai começar de novo com essa merda? A gente já se resolveu há duas semanas, não? — O mais baixo virou para trás, encarando-o com os braços cruzados.
— Não acho que terminamos de resolver isso.
— Não mesmo. Você saiu naquele dia sem terminar de nos ouvir e depois nunca mais olhou na nossa cara. Mas foi bom você ter lembrado. Conseguiu amadurecer durante seu retiro espiritual longe do grupo? — indagou com a sobrancelha erguida, e Chanyeol prendeu o ar em seu peito, pensando em como responder.
Se fosse para ser franco consigo mesmo, sabia que só o fato de ficar aquelas semanas afastado, sumido, era um indicativo de que não mudou nada. Tinha a noção de que precisava conversar de forma madura, desculpar-se e resolver o que começou. Porém quanto mais refletia sobre aquilo, mais as palavras pareciam se embolar ao sair da boca, a garganta secar e até os olhos lacrimejarem. Além do orgulho em jogo, odiava a sensação de se sentir vulnerável, mesmo não sendo. Ainda era difícil para si entender que pedir desculpas nunca era sinal de vulnerabilidade, e sim de fortaleza. Não é todo o mundo que consegue ser forte para consertar suas atitudes.
— Não. — murmurou com um fio de voz, quase se encolhendo no banquinho, e Jongdae sorriu convencido.
— Oi? Desculpa, não consegui ouvir direito. — ria provocativo.
— Não, eu não mudei porra nenhuma. — resmungou, respirou fundo e fechou os olhos para se acalmar e não ter que repetir mais uma cena ridícula, qual estava quase ficando profissional. — Melhorou?
— Só de admitir, já é uma mudança. Continue assim. — Jongdae sorriu novamente e virou-se para o teclado, deixando de lado um Chanyeol levemente atordoado.
— Pensei que você ia zoar com a minha cara.
— Já zoei o suficiente, a ponto do nosso grupinho se dissolver. — mordeu o lábio inferior, levemente incomodado em admitir sua parte da culpa.
— Ainda bem que você sabe. — Chanyeol riu baixinho, soltou o ar preso e voltou a dedilhar a música que anteriormente escolheu.
— Você vai ficar até quando nessa de jogar toda a culpa pra mim, uh? — Estava irritado, ainda que finalmente achara o tom perfeito do teclado para tocar uma música que não saía de sua cabeça. — Eu não compito sozinho.
— Não usa minhas palavras contra mim! — reclamou no mesmo tom irritadiço, parando novamente de tocar. — E quem começou foi você.
— Mas quem tá continuando é você. — disse o óbvio. — Sério, você não precisa pedir desculpas para mim agora, nem faço questão. Eu só quero que essa merda de briga boba acabe, porque já não tá afetando mais só a gente.
Suspirou e se rendeu, não conseguiria treinar violão hoje. Tentou parar de ficar na defensiva e escutar o Kim, mantendo os braços cruzados e a carranca de sempre. O outro começou a tocar o início de Sweater Whearer do The Neighbourhood, descontando toda a raiva que sentia naquelas teclas para que as palavras não saíssem dolorosas.
— Eu não sei se você sabe, ou sequer parou para pensar, mas o Sehun e a Yeri estão bem tristes com o que aconteceu há algumas semanas. Pensa que somos os dois melhores amigos deles, brigamos e simplesmente tiramos o conforto que eles sentiam em ficar perto da gente. Tudo porque não conseguimos sequer olhar um na cara do outro sem remoer aquela briga estúpida por algo que é passado agora. — cuspiu aquele desabafo, apertando as teclas com bem mais força. Yeri ouvia tudo de forma abafada pela porta da sala e comprimiu os lábios para segurar vontade de chorar por ele ser tão preciso em tocar naquela ferida, aqueles detalhes que tanto lutava para fugir. — Foda-se se você ainda acha que fui eu que te tirei da vaga da CBX, acabei com suas expectativas, e que agora você não quer mais olhar na minha cara. Mas, sei lá, engole esse sapo que nem fazemos nas mil vezes que você é um babaca narcisista com a gente e finge que estamos bem para pelo menos deixarmos nossos melhores amigos felizes. Pode ser?
Chanyeol balbuciava sem reação, sem conseguir dizer uma palavra como resposta, sem conseguir esconder o coração dolorido e os olhos marejados. Se antes já estava se sentindo péssimo com a situação só de ter brigado com Jongdae, estava pior ainda agora que ele havia deixado bem claro o quanto machucou os amigos. Completamente bagunçado e com os sentimentos desmoronados, tentava não transparecer. O Kim continuava impassível. Todavia, de costas para o maior, conseguia esconder os olhos também marejados, os lábios mordiscados para não deixar escapar nenhum suspiro a mais, ou voltar atrás para desfazer aquelas palavras tão duras. Precisava ser forte, ele precisava ouvir aquilo se quisesse mudar.
Yeri, no lado de fora, estava completamente arrepiada com a carga emocional de toda aquela conversa, principalmente por Jongdae traduzir os sentimentos dela e de seu primo como ninguém, com uma exatidão invejável. Sabia como os dois foram afetados por aquilo, como a atmosfera parecia pesada naquela tentativa de não desmoronarem ali mesmo, então viu que aquela era a hora de soltá-los da “Camisa da Reconciliação” antes que tudo fosse por água abaixo.
— Meninos, o treino de hoje foi cancelado. — disse de forma controlada enquanto abria a porta. Sentiu o coração se despedaçar ao vê-los um de costas para o outro no mesmo estado: de olhos avermelhados, nariz inchadinho.
Chanyeol foi o primeiro a se levantar e sair, tão rápido que ajeitava a capa do violão enquanto andava para longe dali. Torcia para ter algum trem naquele horário, então poderia ir para casa e desabar de chorar como preferisse. O menor continuou ali, estático na frente do teclado tocando o resto da melodia de forma lenta e maquinal, esperando parar de ouvir os passos barulhentos do outro para deixar que as lágrimas escorressem livremente pelas bochechas. Tocada por tudo aquilo, Yeri se aproximou e abraçou o amigo pelos ombros, apoiando seu queixo ali e o apertando em seus braços. Sabia que daquela forma ele se sentiria confortável para chorar e compartilhar seus sentimentos com ela.
Ao menos, o plano deu certo, mesmo que com o final inesperado.
...
Alguns dias depois, o clima continuava levemente estranho. Ao menos os quatros estavam juntos na mesa do refeitório. Almoçando tranquilamente, trocando mínimas palavras, ou olhares, e as poucas coisas que diziam eram quase pisando em ovos. Aquele não era seu melhor estado, porém estavam juntos de novo. Sem competições ou brigas, apenas os quatro ali em uma companhia confortável e desconfortável ao mesmo tempo.
Até que um quinto elemento decidiu se juntar à mesa. Junmyeon não soube com detalhes do resultado do plano, apenas que dera certo. Por isso, sentiu-se confortável em se sentar ao lado de Sehun, que de prontidão abraçou seus ombros para chegar mais perto, gerando um sorrisinho pequeno em cada um ali. No entanto, seus olhos sonolentos não passaram despercebidos pelo maior.
— O que houve, Jun? — perguntou preocupado. — Você tá com uma carinha de sono...
— Ah, eu não dormi direito hoje. Seok ficou ensaiando até tarde para o Show de Talentos, não consegui pegar no sono de jeito nenhum. — respondeu com certo desânimo ao terminar de mastigar o macarrão da sopa.
Os dois primos soltaram um “ah” simultaneamente, numa mistura de entendimento e preocupação, principalmente por citar Aquele-Evento-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado. Conhecia o Kim e sabia que, por não saber do estado de Jongdae e Chanyeol, poderia soltar alguma coisa que serviria de gatilho para eles brigarem de novo. Seria difícil explicar que mesmo juntos, todos estavam pisando em ovos para normalizar a situação entre eles.
— Falando nisso... — Junmyeon continuou e os dois primos torciam internamente para que ele não tocasse naquele assunto. — Vocês ainda vão tocar no Show de Talentos? — “Merda, ele falou!”, pensaram.
A mesa ficou em um silêncio constrangedor, um olhando para o outro esperando uma resposta. Jongdae e Chanyeol até pararam de comer para pensar no que responder, temendo começar uma briga e voltarem à estaca zero depois que tanto fizeram para reunir os quatro.
— Não. Eu até ia, se tivesse entrado para a CBX. Mas como não entrei... Não sei se vou. — o Park respondeu levemente emburrado, com o olhar fixo na comida.
— É, idem. — Jongdae respondeu desinteressado, enrolando e enrolando o udon nos hashis.
— Mas vocês não pensaram em, sei lá, apresentar sozinhos? — tentou continuar a conduzir a conversa, ainda sendo delicado.
— Eu acabei desanimando — comeu uma dose generosa de macarrão até encher a boca, esperando não ter que se pronunciar novamente.
— Eu também, e nem sei se conseguiria me apresentar sozinho. — o Park respondeu depois de uma golada no refrigerante.
— Então porque não canta junto com o Jongdae? — sugeriu e os outros dois da mesa quase caíram para trás. Aquela conversa com o Junmyeon tinha tudo para dar errado e só ele não estava percebendo.
— Aí você já está querendo demais. — Chanyeol riu e fez questão de ser o mais direto o possível.
— E qual o problema de tocar comigo? — ergueu uma das sobrancelhas, e precisou dessa tensão pré-briga para Junmyeon perceber a merda feita.
— Problema nenhum, eu só não quero. Eu posso não querer tocar com você ou vai implicar até com isso?
— E precisava falar “Aí você já está querendo demais”? Era só falar que não e estava ótimo. — O tom de ambos começou a se tornar irritadiço, e os três do outro lado da mesa estavam tensos assistindo onde tudo aquilo iria parar, só torcendo para que a situação não piorasse.
— Precisava, ué. Mal volto a sentar com vocês e já vem essa história de tocar junto contigo. Não é assim que a banda toca, não. — reclamou, largando o garfo dentro do prato, declarando que estava satisfeito, e furioso. — Mas tudo bem, se quer uma resposta melhor: Não, Jongdae, eu não gostaria de tocar com você no Show de Talentos. Desculpe-me por não aceitar seu convite, Junmyeon. Melhorou? — fingindo ser um lorde, tentou se desculpar formalmente.
— É, bem melhor. — disse entredentes, revirando os olhos com aquele cinismo todo.
— Ah, quem tem que se desculpar sou eu. Eu não queria fazer vocês brigarem de novo... — Junmyeon disse tímido, arrependido por ter puxado aquele assunto.
— Está tudo bem. A culpa não é sua, cara. — Chanyeol tentou o tranquilizar com um sorriso amistoso, sabendo que realmente não era a intenção dele reviver o assunto. Isso deixou os dois primos mais calmos, até ouvirem a continuação da frase: — É do Jongdae, que não sabe levar um não.
— Eu? Fui eu que briguei com todo o mundo porque levei um não da CBX, por acaso? — alfinetou, tendo Sehun e Yeri segurando as reações a cada resposta ácida.
— Não, mas você ficou todo irritadinho só porque eu disse que não quero tocar contigo.
— Eu não gostei do jeito que você falou comigo, só isso, seu insuportável.
— Então toca comigo para ver se eu sou um insuportável ou não. — Chanyeol disse irritado.
— Desafio aceito. — disse com os olhos semicerrados e tom num quase rosnado, aceitando no calor do momento.
Então, depois daquela discussão, cada um virou para um lado e seguiram fazendo suas coisas até que o sinal batesse, enquanto Sehun, Junmyeon e Yeri permaneciam sem reação. Mesmo com aquela conversa recente, eles não mudaram absolutamente nada. E, para piorar: agora tocariam juntos no show de talentos. A metáfora da Camisa da Reconciliação nunca foi tão real e presente, e eles esperavam que se resolvessem com aquela convivência vinda dos ensaios.
No entanto, só foram perceber o feito no meio da aula, quando esfriaram a cabeça e conseguiram pensar racionalmente em suas decisões impulsivas. “Tocar juntos? De quem foi essa ideia tosca?” pensaram quase ao mesmo tempo, e se entreolharam espantados no meio da sala de História cheia de alunos. Se fosse apenas chegar no dia e apresentar, o problema seria menor. Todavia, a performance em dupla contava com decisões em equipe e ensaios frequentes. Para isso, precisavam conviver e conversar um com o outro, coisa que estavam tentando evitar desde aquele dia do Clube de Música.
Desistir? Desistir não era uma opção. Para eles, o primeiro a desistir seria zoado pelo outro por “arregar”. E quem é que queria ser zoado por “perder” na competição indireta de quem se suportava por mais tempo? É, não teriam como voltar atrás.
...
Lá estava Jongdae, parado na frente da casa dos Park, encarando a campainha sem coragem alguma de tocá-la.
O casebre bege de pintura levemente desgastada pelo tempo eram umas duas estações depois de onde morava, então não demorou muito para chegar. Depois de perceberem a besteira que fizeram, não brigaram muito até decidirem o local dos ensaios. Aquela seria a primeira reunião para os dois, faltando menos de um mês para o Show de Talentos. Precisavam rapidamente decidir como fariam e que música cantariam, sem que criassem mais problemas que já tinham.
— Eu sei que minha casa é linda, mas não vai querer entrar? — Chanyeol, com roupas tão confortáveis quanto as dele, perguntou com o corpo debruçado no batente da porta, rindo baixinho do Jongdae todo desnorteado por ser atendido antes de tocar a campainha.
— Como soube que cheguei?
— O Toben latiu bastante pela casa e meu quarto é logo ali, — apontou para a janela próxima da porta. — então não foi difícil te ver parado feito estátua. Entra aí.
O Kim aceitou o convite de bom grado, retirou os sapatos para entrar e não demorou para ter as bochechas apertadas pela Sra. Park, que sempre gostou muito dele. Não muito depois, veio Toben o receber com latidos e mordidinhas na barra da calça, e até arrastou uma de suas bolinhas para brincar. Foi difícil separar o cachorrinho de pelos enrolados da visita, mas se Chanyeol não o deixasse para fora do quarto, não conseguiriam conversar em paz com tantos latidos, mordidas e xixi no pé por conta da agitação.
Enfim, novamente a sós.
O clima continuava desconfortável entre eles, como se ainda pisassem ovos. Haviam resquícios daquele dia do Clube da Música, e certo receio por se prenderem naquela prova de resistência, sem saber se no final aquilo daria certo ou não. Porém, não podiam fazer pré-julgamentos, e Jongdae naquela vez tomou a frente:
— Então... — disse baixinho, tentando cortar o silêncio e captar a atenção do mais alto deitado em sua cama. — Você pensou em algo para nossa apresentação?
— Não muito... — riu sem graça. Para falar a verdade, seu cérebro demorou para apagar sua apresentação perfeita e ilusória com a CBX, então precisava reformular tudo para uma nova apresentação. — E você?
— A única coisa que pensei era que você deveria tocar violão e eu, cantar. É no que somos melhores, pode dar bastante certo.
— Finalmente admitiu que sou melhor que você no violão. — riu novamente.
— Não enche, porra! Se for ficar de competição de novo eu saio agora mesmo da sua casa. — Jongdae ditou irritado, cruzando os braços e parando de girar na cadeira da escrivaninha. — E levo seu cachorro junto!
— Só comentei, só comentei. — deu-se por vencido, e ganhou um resmungo como resposta.
— Enfim... Você tem alguma música em mente? Tem que ser alguma que a gente goste e seja fácil de aprender, estamos muito próximos do prazo e precisamos preencher logo a ficha.
— Nenhuma, de verdade. Podemos ouvir algumas agora para ver se bate a inspiração.
O mais baixo concordou de prontidão e logo caçou o celular e os fones no bolso para começar a procurar por suas playlists suas músicas preferidas, assim como Chanyeol. Ele também procurava por entre seu caderno de música, recheado de partituras para filtrar as que seriam melhores ao som do violão.
Na teoria a ideia foi boa, fácil de ser executada. Na prática... Foi mil vezes mais complicado. Tudo o que Jongdae sugeria, o outro de prontidão descartava e chamava de chato. O mesmo com o Chanyeol, que tinha suas “músicas de dormir” jogadas para escanteio. A situação parecia se complicar cada vez mais, já que a tarde ia passando, a paciência se esgotando e nunca conseguiam chegar em um consenso.
— Por que toda música que eu escolho você rejeita? Que merda! — Chanyeol se levantou impaciente da cama, sem aguentar aquele ciclo infinito de “nãos”. — Eu escolhi várias músicas legais e que sei tocar, e nenhuma você quis.
— Claro, todas elas são chatas. E você não aceitou nenhuma das minhas sugestões também. — respondeu impassível.
— Porque todas as suas músicas são chatas, oras.
— E desde quando Maroon Five é chato? — Jongdae ficou revoltado, já que se tratava de uma de suas bandas preferidas.
— E desde quando Arctic Monkeys é chato? Você que não entende de música!
— Eu entendo de música muito mais que você, e Maroon Five é ótimo.
— Se entendesse de música mesmo, não iria gostar de Maroon Five.
— Ugh, e se continuarmos assim não vamos apresentar porra nenhuma. Dá para focar? — tentou retomar a concentração para não se perderem brigando por nada.
— Tá, tá... — respirou fundo e sentou na borda de sua cama. — Seguinte: vamos tentar encontrar bandas que nós dois gostamos, e com isso procuramos uma música delas, ok?
Jongdae fez que sim, rendendo-se àquela ideia e começou a procurar a listagem de artistas no seu player de músicas para começar um jogo de perguntas e respostas, como um pingue-pongue: alternadamente, um dizia o nome de uma banda preferida e o outro deveria dizer se curtia o som ou não. As que tivessem um “sim” em comum eram anotadas no bloquinho de Chanyeol. Depois, iriam eliminando aos poucos de acordo com o quanto o estilo das músicas combinava com o timbre e os instrumentos disponíveis
Apesar de cansativo, foi uma dinâmica divertida. Na maioria das vezes, perdiam mais tempo com suas diferenças e brigando para provar seu ponto em discussões bobas. Porém, aquela tarde, tiveram um bom momento em semanas resumidas em farpas, e perceberam que tinham mais gostos em comum do que o esperado. Ficaram tão surpresos por tantas bandas na lista que pareciam esquecer que, antes de tudo, eram melhores amigos e compartilhar gostos em comum era algo normal. Provavelmente se Sehun e Yeri vissem aquela cena, ficariam orgulhosos de os ver sem brigar por duas horas.
— Ok, acho que das nossas eliminatórias, ficou sobrando The Cranberries e Oasis. — Chanyeol disse enquanto riscava o último nome da pequena grande lista. — A maior parte das músicas dessas duas bandas são interessante para nós. Menos Wonderwall.
— Ei, por que “menos Wonderwall”? — perguntou irritado. — Essa música é muito gostosa e os acordes você consegue decorar fácil.
— Porque eu não aguento mais tocar essa música. — bufou. — Toda festinha de família que eu vou é a mesma merda: “Vai, Chanyeol, toca Wonderwall para a gente!”. O refrão me assombra de noite, sem brincadeira.
— Tudo bem, tudo bem. — respondeu depois de se recuperar de uma crise de risos. — Tem outras músicas legais deles para tentarmos.
— Também tem as da The Cranberries... — rolava a lista de música da banda para pensar em alguma em que se enxergava apresentando junto do outro, parando ao encontrar uma. — Que tal Linger? Ou... Ou Zombie? Eu gosto da versão acústica dessa.
— Hm... Zombie parece ser legal... — puxou de sua mente alguns pedacinhos da música, pensando se conseguiria reproduzir a técnica vocal da vocalista ao cantar. Enquanto isso, também procurava por músicas do Oasis para sugerir e, ao achar uma em específico, não evitou de abrir um grande sorriso.
— Tá rindo aí por quê? — Chanyeol olhou desconfiado, sem entender muito bem.
— Acho que encontrei a música perfeita, e você vai adorar porque a letra dela é ótima. — riu baixinho. — Don’t Look Back in Anger, conhece?
— Hm... — pensou por um tempinho, tentando se recordar dela, no entanto apenas lembrava do ritmo e de uma pequena parte do refrão. — And so Sally can wait... — cantarolou baixinho.
— She knows it's too late as we're walking on by... — completou a letra, gerando um sorrisinho tímido de ambas as partes. — É essa mesmo. Acho que poderíamos apresentar, depois dá uma olhada na letra.
Sorriram confortáveis por terem entrado em um consenso, estavam até mais confiantes para fazer uma boa apresentação no dia do concurso, a ponto de Chanyeol conseguir pegar de ouvido a cifra da música com muita facilidade. Jongdae voltou para casa um pouco mais cedo do que esperava a pedido de sua mãe, que ficava preocupada com a cidade naquele horário tardio. Ao menos, conseguiu plantar aquela ideia na cabeça do moreno e tinha quase certeza absoluta que seria a música escolhida.
Como estava ficando tarde para a aula do dia seguinte, Chanyeol decidiu tomar um banho e se preparar para ir dormir. Para sua infelicidade, mesmo com muito esforço, não conseguia pregar os olhos. Sentia que tinha algo faltando a se fazer, então passou a recapitular e listar tudo o que tinha feito no dia para ver se não estava esquecendo de nada. No final, sua falta de sono tinha uma causa bem diferente: curiosidade.
Desde que Jongdae fora embora de sua casa, não parava de pensar na tal música que havia sugerido, ainda mais por ter frisado a letra. Não era bom no inglês, apenas dava uma tapeada na pronúncia depois de muito treinar, então precisou pegar um site de traduções para lê-la sem problemas. Só com o título, que significava “Não olhe para trás com raiva”, levantou uma das sobrancelhas, levemente desconfiado do que deveria se tratar.
Deslize para dentro do olho de sua mente
Você não sabia que poderia encontrar
Um lugar melhor para brincar?
Você disse que nunca esteve
Mas todas as coisas que você já viu
Irão lentamente desaparecer
À medida em que começava a acompanhar a música tocando nos fones de ouvido, ia imaginando como seria a performance no dia do Show de Talentos, tentando ler nas entrelinhas das mensagens que a música queria passar. A voz de Jongdae soando doce e suave em seus ouvidos, os dedos com aquela dor gostosa de tanto tocar violão, de tanto treinar para alcançar a perfeição.
Então eu começo uma revolução da minha cama
Pois você disse que minha esperteza havia subido à minha cabeça
Então, o Park ironicamente riu daquela parte em específico. Coincidente, encontrava-se deitado em sua cama, de onde era dito para começar a tal revolução. Claro, era uma metáfora para dizer que a mudança sempre começa com você, porém para ele aquilo se tornava ainda mais pertinente depois da segunda frase. Foi inevitável lembrar daquelas palavras duras do melhor amigo, e de sua promessa mental de que iria mudar. Jongdae pensou em tudo.
Pise do lado de fora, o verão está florescendo
Fique ao lado da lareira
Tire esse olhar da sua cara
Você nunca irá queimar meu coração
Então Sally pode esperar
Ela sabe que é tarde demais
Enquanto caminhamos
A alma dela se afasta
Mas não olhe para trás com raiva
Eu ouvi você dizer
Naquele ponto, não sabia como Jongdae conseguiu encontrar uma música que combinava tanto com aquele momento. Estava arrepiado, os sentimentos remexidos em seu âmago por imaginar o menor cantando cada uma daquelas palavras para si, olhando em seus olhos, como uma confissão, um pedido de desculpas, ou um apelo para mudança.
Me leve ao lugar que você vai
Onde ninguém sabe se é noite ou dia
Por favor não ponha a sua vida nas mãos
De uma banda de rock n'roll
Que jogará tudo fora
Foi ali que sentiu uma pontada no peito, identificando-se tanto com a mensagem passada com tanta exatidão que não conseguia aceitar que aquilo era apenas uma feliz coincidência. Céus, Jongdae pensou em tudo, e agora se encontrava com os olhos lacrimejando novamente. Porém, daquela vez, tinha uma música em seus fones o abraçando forte, o entendendo por completo e sussurrando “Está tudo bem, a mudança começa de você”, como um conselho de mãe e um empurrão da vida.
Então eu começo uma revolução da minha cama
Pois você disse que minha esperteza havia subido à minha cabeça
Pise do lado de fora o verão esta florescendo
Fique ao lado da lareira
Tire esse olhar da sua cara
Pois você nunca irá queimar meu coração
Então Sally pode esperar
Ela sabe que é tarde demais
Enquanto ela caminha
Minha alma se afasta
Mas não olhe para trás com raiva
Eu ouvi você dizer
Daquela parte até o final da música, Chanyeol já estava se debulhando em choro. O coração transtornado, batendo rápido demais para o ritmo calmo da melodia, transbordava em forma de lágrimas, e o rapaz apertava o celular no peito com tanta, mas tanta força na esperança de que toda aquela dor fosse passar.
Todas as lembranças dolorosas de três anos para cá o atingiram como uma avalanche ao voltarem a flutuar por sua mente. Via todos aqueles momentos como flashbacks enquanto a música tocava pela segunda ou terceira vez no replay. Era terrível ver como era o maior responsável de tudo dar errado consigo, era pesado carregar em suas costas a culpa que costumava passar para os amigos, e pouco a pouco se tornava cada vez mais sufocado em suas próprias palavras, suas próprias atitudes.
Como agradecia que seus pais tinham um sono pesado, se não conseguiriam ouvir seu choro alto e sôfrego que provavelmente ecoava pelos corredores da pequena casa. Porém, no fundo sabia que aquela era a música perfeita, a melhor que poderiam escolher, já que se sentiu tão tocado. Agora só precisava, literalmente, começar a revolução em sua cama. Ao menos, havia conseguido digerir por partes tudo o que precisava fazer, engolir os conselhos seus amigos lhe diziam em todos aqueles anos.
Era um idiota. Um completo idiota. Mas nunca deixou de amar Jongdae.
...
Assim que acordou, antes mesmo de tomar o café, Chanyeol enviou uma mensagem para o amigo confirmando que aquela seria a música. Não tinha nem como brigar por outra ou discutir para provar seu ponto, realmente Don’t Look Back in Anger era perfeita, Jongdae a escolheu sabendo disso.
Como estava confirmado, só lhes restava fazer a inscrição e ensaiar o mais rápido possível, pois o concurso seria em três semanas. Mesmo com toda a conversa, choradeira por causa de música e reflexão sobre seu comportamento nos últimos dias, os dois amigos ainda assim não paravam de brigar para a infelicidade de Yeri e Sehun. Porém, eles perceberam que até essas brigas tinham mudado. Por exemplo, quando apostaram uma corrida até a secretaria e o primeiro que chegasse iria preencher a ficha de inscrição, quando Jongdae ganhou, única coisa de ameaçadora que Chanyeol disse foi “na próxima eu te ganho” e ambos começaram a rir. Por mais que estivessem felizes em vê-los juntos novamente, ainda era estranho ver que estavam bem um com o outro e não uma briga catastrófica que nem aconteceu no último mês.
Apesar de toda evolução que o método “Camiseta da Reconciliação” sugerido por Junmyeon causou, Jongdae ainda sentia que o Park estava estranho consigo. Passou-se uma semana inteira de ensaios nos dias em que não tinham reuniões no clube da música, conseguiram decorar a letra e começaram a ajustar o tom para combinar com o timbre do vocalista, a apresentação estava bem encaminhada. No entanto, o mais alto parecia travado consigo, como se estivesse escondendo algo naquela defensiva tão grande. Esperou mais um tempo para ver se não era algo a ver com os ensaios, perguntando sempre seu desempenho vocal e até se a pronúncia do inglês estava boa, mas ele nunca parecia reclamar. Na verdade, ele nunca travava na resposta, indicando que o que escondia não era naquela área.
Ao tentar relevar, percebeu algo: Quando cantava, os olhos de Chanyeol não saíam de si ainda que estivesse tocando violão. Percorriam seu corpo com carinho e paravam em seu rosto com certa admiração, acompanhado de um sorrisinho bobo. Era algo tão natural que o maior sequer percebia que acontecia, só quando a música acabava e precisava desviar o olhar antes que ele notasse. Mas Jongdae notou, e incrivelmente achava muito fofo vê-lo envergonhado.
Perguntava-se desde quando isso ocorria, pois viu acontecer várias vezes durante o ensaio e lembrou-se de alguns anos atrás, quando percebeu como o maior o olhava durante as aulas, parecendo mais concentrado em captar seus detalhes que em prestar atenção na matéria. As pequenas peças do grande quebra-cabeças que era a relação deles começaram a se encaixar e a resposta parecia tão boba, tão óbvia que chegou a soltar uma risada alta demais para ser apenas seu pensamento, o que despertou a curiosidade de Chanyeol.
— Tá rindo de quê? — perguntou levemente bravo por ter-lhe tirado a concentração enquanto tocava violão, treinando de novo e de novo para não errar o dedilhado do pequeno solo que tinha.
— Nada, nada... Eu só percebi uma coisa muito óbvia. — respondeu ainda com um sorriso convencido nos lábios, relaxando na cama do Park em mais um ensaio em sua casa.
— O quê? Que você é um chato? — provocou, com uma das sobrancelhas erguidas em curiosidade. Jongdae fez que não.
— Eu percebi que você ainda gosta de mim. Desde o primeiro ano. Estou certo? — foi direto e inclinou a cabeça para ver a reação de Chanyeol.
Ainda que quisesse muito, seu corpo não lhe respeitava e ficou completamente travado ali na cadeira. Sequer conseguia continuar a tocar o violão para disfarçar. No entanto, não conseguia olhar de volta o garoto que ria convencido em sua cama. Chanyeol estava se sentindo naquelas cenas finais dos episódios de Scooby Doo, onde a turma desmascarava quem era o monstro que os aterrorizava, só faltava gritar “Tudo culpa dessas crianças enxeridas!”. Não conseguia nem formular uma resposta minimamente plausível para aquela situação, a mente estava em branco e apenas conseguia balbuciar algumas palavras desconexas.
— Eu acertei, não foi? — levantou-se da cama, indo lentamente em direção ao maior paralisado na cadeira giratória.
— N-não... Não. — ainda estava na defensiva, negando várias vezes com a cabeça.
— Você está há um bom tempo nessa defensiva, acho que desde aquela vez do clube de música. — com cuidado, pegou o violão com facilidade de suas mãos e o apoiou no suporte em pé, prevenindo-o de mudar de assunto. — Admita, Yeol: você mentiu para todo o mundo, inclusive você mesmo, e continuou gostando de mim por todos esses três anos.
— Não... eu já desencanei de você, Dae. — disse sem muita firmeza, tímido e nervoso, com a voz a ponto de soar ofegante de tão agitado que estava. — Desde que soube que você gosta do Baek.
O menor deu uma risadinha sem graça, passando a emaranhar os dedos nos fios negros macios, penteando a franja para lá e para cá como num cafuné. Sabia que aquilo o acalmava bastante, e precisava dele calmo para conversarem sobre algo delicado que tanto tardaram para tocar.
— Eu já disse, parei de gostar dele faz tempo. Hoje somos só amigos. — Chanyeol o olhou de sobrancelhas erguidas, ainda incrédulo. — Ele me deu um fora, e foi assim que descobri que ele é hétero, se quer saber.
— Você disse, mas eu... Eu não quis acreditar em você.
— Porque pensou que eu estava blefando, que nem você, certo? — sorriu convencido de novo ao vê-lo fazer que sim novamente. Mesmo que Jongdae fosse sempre muito pontual com as palavras, ele ainda se surpreendia com cada conclusão. — Hoje em dia, eu gosto de outra pessoa...
— Quem? — perguntou preocupado, enfim olhando-o nos olhos, podendo vê-lo sorrir sem entender o motivo.
— Você, seu bobão. — confessou e os lábios do maior se entreabriram.
Chanyeol estava completamente sem reação, do jeito que o Kim esperava que fosse acontecer. Ainda assim, não conseguia tirar o sorriso do rosto por finalmente botar tudo aquilo para fora e um peso sair de suas costas. Os dois corações estavam agitados, mais do que nunca antes, e um sorriso suave misturado ao olhar sereno dos dois era o mais marcante. O mais alto não aguentou e se levantou para ter Jongdae em seus braços, abraçando-o forte como sempre quis, como sempre imaginou, como a música escolhida havia feito consigo todas as vezes que o ouvia cantar. Ficaram ali naquele abraço gostoso, sem realmente conseguirem se soltar um do outro, decretando o fim do ensaio naquele dia para passarem o resto do tempo juntos, até que a noite caísse. No entanto, Jongdae ainda não tinha terminado de falar.
— Eu ainda preciso te pedir uma coisa. — afastou-se um pouquinho para poder olhar diretamente em seu rosto.
— Não acha que está indo rápido demais? — Chanyeol perguntou desconfiado, e Jongdae riu por ele ter pensado que era um pedido de namoro ou algo parecido.
— Não é isso... — soltou uma risada alta e o abraçou um pouquinho mais apertado. — Eu queria te pedir para segurar um pouquinho essa competitividade. Acho que foi uma das coisas mais difíceis para lidar quando vi que estava gostando de você. Às vezes isso te sobe à cabeça, e foi difícil me aproximar porque você vivia competindo comigo, até me botando para baixo as custas disso.
— Merda... — murmurou cabisbaixo, percebendo novamente como sempre era o culpado por estragar tudo entre eles. Relutou um pouquinho em seu interior para deixar o orgulho de lado e dizer baixinho. — Você me desculpa por isso? Arg... Eu odeio te fazer sentir assim, e juro que a competição não era contigo. Não era pra te deixar mal... — sorriu de lado pelo pedido de desculpas, e também por mais uma pecinha do quebra-cabeças.
— A competição não era comigo? Era então com o... Baek? Só porque eu gostava dele? — indagou desapontado e Chanyeol, envergonhado, fez que sim. Cada hora aparecia uma nova infantilidade dele para lida. — Isso é ridículo, o Baek nunca te fez nada, não é justo com ele...
— Eu sei, eu só... É idiotice minha. — deu-se por vencido. Odiava ter que admitir seus defeitos, pois sempre se sentia um bobo por ser desse jeito. — Na minha cabeça, se eu fosse melhor que o Baek, você iria gostar de mim. Mas isso não tem nada a ver... Eu vou parar de ser assim, é sério.
— Vai parar porque se arrepende ou porque alcançou seu objetivo? — Jongdae perguntou com os cenhos erguidos, vendo o outro rir baixinho com aquele jeito questionador dele.
— Porque me arrependo de ser infantil. Tá feliz, Sócrates? — E riram juntos, balançando-o em seus braços para lá e para cá devagarinho. Vendo que o clima de desabafo parecia mais leve com aquelas brincadeiras, mais leve do que Chanyeol pensou. — E você, não pense que vai escapar.
— Eu? — Jongdae perguntou sem entender.
— Você mesmo. Se odeia tanto que eu seja competitivo, porque você fica provocando? — Sua expressão era séria, olhando diretamente para o outro, ainda sem palavras para responder. — Próxima vez, ao invés de botar pilha, me trava!
— Então temos um trato, uh? — soltou uma das mãos de sua cintura para levantar o mindinho na altura do rosto, em tom de promessa. — Eu vou parar de te provocar, e você vai pensar duas vezes antes de competir com alguém, certo?
— Certo. — Chanyeol levou seu mindinho ao semelhante e apertou levemente e deu um leve selar nos dois, selando a promessa. — Trato feito.
Aquele contato só foi desfeito para se abraçarem bem forte, e Jongdae se aconchegar no corpo do mais alto. Não conseguia mensurar o quão feliz estavam naquele momento, parecia que aquela tempestade que eles mesmos causavam conseguiu se transformar em um dia ensolarado. Também, era um peso a menos nas costas saber que não tinham mais nenhum segredo para guardar, esconder a sete chaves e que a partir de agora, sentiam-se mais estimulados a mudar, tanto um pelo outro, quanto por si próprios.
Chanyeol, de tanto tempo que passou olhando de pertinho cada detalhe de Jongdae, o cheiro suave que desprendia de seu corpo, o calor daquele abraço, até o respirar parecia adorável. Não conseguia resistir, e levou os lábios a testa do rapaz, selando com carinho. Como resposta, levantou o corpo na ponta dos pés e, após segurar seu rosto entre as mãos, beijou os lábios cheinhos com todo o carinho do mundo. Na hora, ficaram estáticos, surpresos. Um, espantado com a própria atitude; o outro, ainda sem acreditar que aquele momento estava realmente acontecendo. Sequer sabia como reagir, estava nervoso, mas como se tudo naquele casal fosse movido a música, eles aos poucos encontravam seu próprio ritmo lento para se tocarem e conhecerem melhor um ao outro. Continuava com os braços envolvendo a cintura colada a sua, mas agora fazia um leve carinho com a ponta dos dedos, transbordando de amor. É, o treino de hoje definitivamente acabou. Só pararam quando o Sr. Park bateu à porta para oferecer um lanche, e não eram nem loucos de negar. Comida em primeiro lugar sempre, e mereciam depois de ficar a tarde toda treinando sem pausas, precisavam descansar.
Como a noite não demorou para aparecer, o Kim se despediu da casinha branca a contragosto, pois ainda queria ficar ali com ele mais um tempinho. Curtir mais um pouco daquele cafuné gostoso, lábios carinhosos e abraço quentinho. Porém, voltava feliz, e sequer conseguiu tirar o sorriso do rosto o caminho inteiro.
...
Alguns dias depois, o par de primos recebeu a notícia da trégua naquela briga dos dois e do tal trato, e eles não poderiam ficar mais felizes. Depois de aguentar aquele segredo escondido por tanto tempo e suas brigas como consequência, era bom saber que eles se resolveram — e até trocaram uns beijinhos, olhe só! As semanas foram correndo com calma, parecendo saber da necessidade que Chanyeol e Jongdae tinham de ensaiar e passar um tempo juntos. Apesar do tempo curto, estavam mais que confiantes para dar o melhor de si naquela competição, independente do resultado final.
Yeri acabou não se convencendo de participar do Show de Talentos também, mas depois da insistência de Jongdae, começou a também postar covers no youtube e as respostas por enquanto estavam realmente boas. Enquanto isso, Sehun e Junmyeon, por conta da rotina, acabaram se vendo um pouco menos. Sehun precisava comandar o time nas quartas de finais dos jogos interescolares, enquanto Junmyeon treinava cada vez mais sua apresentação para o Show de Talentos, na categoria de dança junto de outros líderes de torcida. No entanto, esses desencontros não impediram o Kim de pedir o altão em namoro, com aliança e tudo, e ele quase chorou ao ver a pequena coreografia que as líderes de torcida montaram no ginásio para a ocasião. Alguém como ele do seu lado o apoiando no que fosse era tudo o que precisava para levar a taça do campeonato para a estante de troféus do Dong Soon.
Apesar dos problemas e obstáculos, os dias continuavam a passar e os amigos continuavam a ultrapassa-los confiando um no outro, ainda mais unidos e transparentes depois daquele tempo que passaram fragmentados. Tanto que o dia da apresentação não tardou a chegar.
Naquele sábado, diferente do normal, o colégio estava lotado até o teto. Até porque, não haviam só alunos ali. Tinham pais, irmãos, professores, amigos transitando pelo local atrás do caminho para o auditório principal, onde aconteceria o tão aclamado Show de Talentos. Ao mesmo tempo, no segundo andar havia uma grande correria de alunos se preparando para suas apresentações, divididas entre Apresentações Musicais, Danças e Variedades — que ia do simples stand up show à mais complexa mágica. Quando a diretora falou ao microfone, dando início a tudo, o coração de todos parou, era a hora de se apresentar.
A dupla, já no camarim, permanecia de mãos dadas desde a hora que chegaram, dando força um para o outro — força até de mais para o lado de Chanyeol, que espremia as mãos dele até doer. O frio na barriga da apresentação não era incomodo, e ao verem seus familiares e amigos, que arranjaram um pequeno tempo do dia para lhes apoiar naquele momento tão especial fazia com que sorrissem bastante, sentiam-se confortáveis e tudo o que importava era fazer o melhor show para eles.
“Agora, recebam ao palco Jongdae e Chanyeol com a música Don’t Look Back in Anger da banda Oasis!”
Entreolharam-se surpresos por sua vez chegar tão rápido e subiram no palco ao som da salva de palmas bastante receptiva para ficarem em seus lugares para ajeitarem a altura dos microfones com ajuda dos técnicos dispostos ali, coisa de menos de um minuto.
— Três, dois, um... — Chanyeol contou baixinho enquanto batia o pé no chão para que começassem de forma harmônica.
No instante que tocou a primeira nota, o silêncio respeitoso do público veio e puderam começar oficialmente a apresentação de suas vidas. Os dedos deslizavam pelas cordas do violão num dedilhar calmo, afinado, enquanto a voz doce de Jongdae completava aquele clima confortável que queriam passar, pois era dessa forma que aquela canção os tocava. Calma, suave, como um conselho de amigo, um abraço verdadeiro. Era isso que ela significava para eles. Vez ou outra, não conseguiam resistir de trocar olhares durante a apresentação, junto de sorrisos bobos incrédulos de que realmente estavam ali mesmo, tocando juntos tão felizes e apaixonados, compartilhando aquele amor que transbordava com o resto do público.
Assim que terminaram de tocar, fizeram uma breve reverência à plateia que os aplaudia de pé com aquela interpretação tão boa da música e logo se abraçaram com o coração palpitando forte, a felicidade que sentiam não cabia no peito. Já no camarim, ganharam um grande abraço de cada um dos membros da CBX, que eram os próximos a se apresentar. Tinham superado aquele resultado e depois daquela apresentação tão gostosa não precisavam de mais nada além da companhia um do outro. Tudo bem, tudo bem, até que eles sentiam um pouquinho de inveja de como a apresentação de Rock And Roll All Night da banda Kiss estava impecável e como várias pessoas se aglomeravam na frente tentando grava-los como se realmente fosse um show de rock de verdade, mas nada podia estragar aquele momento tão deles. Nem o fato de pegarem o terceiro lugar, e não o primeiro — que ficou com a CBX, obviamente —, conseguia os abalar, pois de qualquer forma foram bastante elogiados pelos jurados, e conseguir aquela posição perto de tantos alunos que participaram era uma vitória. A vitória que tanto almejavam para fechar aquele período do Ensino Médio com chave de ouro.
Era um sinal de que todos aqueles problemas que criaram no semestre foram resolvidos, apesar das brigas, lágrimas e separações. O que importava era que as novas dificuldades que viriam poderiam contar com o outro para resolver de forma madura e calma. E o passado? Bem, era só seguir a lição dos irmãos Gallagher: não olhe para trás com raiva.
Ippeunnie Sun 12 Jun 2022 01:45AM UTC
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