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Ratos de Porão

Summary:

O nerd que não perde reprises de A Família Dinossauro, o não-mauricinho-de-dedos-azuis que precisa de ajuda com as palavras-cruzadas e o falso grunge apaixonado por Backstreet Boys e Jon Bon Jovi estão em sua ilha particular como os bons ratinhos de porão que são.

Notes:

queria saber inglês pra traduzir porque tem muita gíria e referência br... vai em pt mesmo.

Work Text:

— Ei, qual é a gíria usada para prisão e cadeia mesmo? — perguntou Jeong Yunho.

Ele está debruçado sobre um jornal aberto em cima de sua cama. O lápis balança no ar e ele rói a unha do dedão manchado de azul — graças a semana passada, quando inventou de pintar o cabelo com papel crepom, mas esqueceu de colocar luvas.

— Acho que é xilindró — respondeu Kim Hongjoong, folheando o livro que tinha em mãos.

Estava a procura de algo novo na estante empoeirada do quarto de Yunho agora que enjoou do toca-fitas cassete portátil, mas só tinha coisa do arco da velha lá, e ele perdera o total interesse em ler ao dar por falta de folhas e notar rabiscos em alguns dos exemplares. Obra de Song Mingi em seus acessos de tédio.

— Maior órgão do corpo humano?

— É a pele, né? — ele respondeu como se ensinasse algo simples a uma criança burra.

Aquilo era tão doido.

Embora amasse palavras-cruzadas, Yunho sempre precisava de ajuda para respondê-los. Hongjoong esperava que isso ao menos o fizesse jogar fora parte da velharia que tinha no quarto antes que o lugar voltasse ao que era antes: um verdadeiro quarto da bagunça.    

Durante anos, fora viveiro de ratos. Os roedores faziam uma patifaria com os papéis da senhora Jeong e, por um tempo, assustaram Yunho que acreditava fielmente que sua casa era assombrada. Por mais incoerente que parecesse, Hongjoong tinha que concordar; os barulhos estranhos que vinha de lá não eram de Deus, não.

Fora preciso muita coragem para que, mesmo antes de uma limpeza básica, eles passassem a se esconder lá já que jogar Sonic no Mega Drive de Yunho deixou de melhorar o humor deles quando ficavam bolados com alguma coisa.

Não tinha nada de especial, só um montão de porcarias, mas eles meio que se sentiam confortáveis e, sem nem se tocarem, Hongjoong, Yunho e Mingi viraram ratinhos de porão com muito orgulho, obrigado!

O jeito foi a Senhora Jeong fazer uma reforminha e agora Yunho dormia em um lugar que era um mix dos estilos High Tech e Memphis, com móveis Biedermeier em cores extravagantes e piso de madeira clara em todo o chão.

Hongjoong deslizou o livro de volta ao seu lugar. Sua atenção fora fisgada por outra coisa. No meio de capas comidas por traças, estava um daqueles cadernos de perguntas que eles faziam no ensino médio.

Os cantos de seus lábios se abriram em um sorriso surpreso, mesmo que não devesse, afinal, quanto mais velho ficava, mais Yunho se assemelhava a um desses lunáticos que guardam um monte de coisas desnecessárias em casa.

É sério! Um dia ele juntará tanta velharia que será preciso uma equipe de busca para encontrá-lo no meio de tanta coisa.

Yunho tinha se formado há dois anos e ainda guardava suas enciclopédias Barsa e Larousse na estante abarrotada de livros, que ainda cultivava no quarto… Ok, talvez isso fosse de alguma utilidade para um de seus irmãos mais novos, mas as agendas repletas de embrulho de bombons, e outras porcarias que eles compartilhavam, já deviam estar no lixo há muito tempo.

Hongjoong e Mingi achavam aquilo muito brega — e isca para colônia de barata —, já Yunho insistia que todas aquelas tralhas tinham um quê especial, então às vezes os outros dois só fingiam que aquilo nem existia.

— Ei, você lembra disso aqui? — ele virou-se para Yunho com um sorriso indecifrável. Bem, indecifrável para o mais novo, pelo menos. Hongjoong tinha certeza que o amigo o havia entendido.

Antes que Yunho pudesse responder, eles escutaram a porta do quarto se abrir. Os pais de Yunho murmuraram. Passam-se alguns segundos, e então ouve-se passos na escada. Um tum-tum-tum que cessou quase de imediato.

— Deve ser o Mingi — disse Yunho, dando de ombros.

Hongjoong se dirigiu para o pé da escada. Era mesmo Song Mingi.

Ele estava sentado, livrando-se de seus coturnos que, assim como sua camisa flanela, sempre usa mesmo no maior calorão. Quem mal o conhecia, o rotulava como grunge por causa de seu estilo e jeitão não ligo para nada. Ah, se soubessem de seu amor secreto por Backstreet Boys.

— E aí! — Mingi saudou do topo ao notá-lo.— O que estão fazendo?

— Nada demais. — respondeu Hongjoong. — Yunho ainda está tentando terminar a palavra cruzada e eu só estou procurando algo pra ler.

— Que chato!

Hongjoong encheu os pulmões de ar, lembrando-se do livro que o Song vandalizou e que agora ele já não queria mais ler e continuou ali, segurando-se no corrimão.

À medida que Mingi começou a descer, não conseguiu evitar pular alguns degraus de uma vez. Hongjoong sempre diz que um dia seu pé se prenderá em um degrau e o fará dar de cara no chão, mas ele não liga. É divertido; como se voltasse aos tempos em que era criança e eles se escondiam ali durante o esconde-esconde.

Pouco antes de pisar no carpete na base da escada, seus movimentos tornam-se sinuosos, ele desceu como uma pessoa cautelosa para não entrar em colisão com Hongjoong, ficando há apenas três degraus acima do mais velho.

O Kim deu um rápido passo à frente, subindo um degrau e amenizando a diferença de altura entre eles. Inútil! Continuava em desvantagem.

— O quê? O que foi dessa vez? — ele ergueu mãos, quando Hongjoong colocou-se em frente a si, como uma barreira de contenção. Embora não houvesse — acreditava ele — feito nada de errado, começara a desconfiar que tinha culpa no cartório, seja lá qual fosse.

— Nada. — respondeu como quem não quer nada, mas é bem óbvio que não era “nada”.

O Kim colocou uma mão em sua cintura para pegar uma embalagem do bolso traseiro de Mingi e se afastou imediatamente. Estavam próximos demais. Podia sentir que estava enrubescendo e conseguia sentir o cheirinho de hortelã de Mingi e um pouquinho de café com canela beeem lá no fundo.

O coração de Hongjoong sacudiu e ele tem certeza que o Song sentiu o mesmo. Os dedinhos tamborilando incessantemente no corrimão nunca o deixaria mentir. Quando nervoso, tudo o que ele quer é dar uma tragadinha.

Mingi verificou todos os bolsos de sua própria roupa e nada.

Ele suspirou e lançou um olhar desconfiado para Hongjoong.

— Tá procurando por isso? — o mais velho sorriu e balançou a caixinha, travessamente, em frente ao seu rosto. — Você não pode fumar aqui. Estamos em local fechado.

— Me devolva e vou mostrar se posso ou não… — ele tentou pegar a caixa de cigarros de volta, mas rapidamente fora tirado de seu alcance e escondido atrás das costas. — Yunho, me ajude aqui!

O rapaz ergueu a cabeça para encarar os amigos pela primeira vez.

— Só se você me dizer como se diz bom dia em francês.

Mingi pensou por um instante, antes de responder, incerto: — Merci?

Yunho baixou o olhar para os jornais e levantou, em seguida, para encará-lo com as sobrancelhas franzidas.

— A resposta certa tem sete letras.

— É “bonjour”, mon amour — respondeu Hongjoong, com um sorriso orgulhoso.

Antes de serem amigos inseparáveis, Mingi e Hongjoong juravam que Yunho seria um tremendo nerd mauricinho no ensino médio. Estando sempre bem arrumado e todo certinho, tinha que ser ele.

Mas o mundo então deu seu giro e, depois de uns anos, Hongjoong também já não tinha traços do roqueiro que todos apostaram que ele seria um dia. Ele era o nerd do trio, assim como Hermione sei-lá-o-quê — personagem de um dos livros que estava planejando surrupiar da estante de Yunho.

— O Joong acertou.

— Tanto faz. — Mingi deu de ombros. — Até parece que você ia me descolar o cigarro.

— Talvez eu fosse, se você não tivesse demorado tanto. Não me diga que ficou xavecando a Seonghwa no IQC de novo!

Ao mencionar o nome dela, sua careta se intensificou. Yunho não tinha nada contra Seonghwa, isso até descobrir que ela era a suposta paixão de Mingi.

— E quem disse que estou afim dela?

Yunho mordeu o lábio inferior.

— Tanto faz, cara — disse ele após uma pausa.

— Você só vai fumar por cima do meu cadáver — cantarolou Hongjoong, tentando quebrar a tensão.

Odiava o clima ruim instalado entre eles tanto quanto odiava quando os três acabavam dando uns beijos, casualmente, e tinha que suportar o gosto de nicotina na boca do Song. Não era sempre, mas ele gostava de precaver-se.

Sabe-se lá quando, de repente, os lábios daqueles dois parecerão tão convidativos que ele não conseguirá se controlar. Não que fosse preciso.

As coisas entre eles podem até ter ficado meio estranho no início de tudo aquilo — que só Yunho não sabia como chamar —, mas nenhum deles pediram em algum momento para que se controlassem.

Mingi ligou a televisão e zapeou pelos canais.

— Está passando A Família Dinossauro — comentou Hongjoong.

— São reprises e já assistimos isso umas mil vezes — ele respondeu, como se estivesse cansado de toda aquela mesmice, mas então colocou a fita do Bon Jovi que, a propósito, ele mesmo assistira umas mil vezes.

A imagem granulada apareceu. Os primeiros acordes soaram pelo quarto e embalaram Mingi o caminho todo até a cama. Ele ajeitou-se ao lado de Yunho apoiando-se sobre os cotovelos. Seu olhos se fecharam enquanto a letra de Bed of Roses saia facilmente de seus lábios.

Hongjoong nunca jogou isso na mesa porque morre de medo de queimar o filme de Mingi, mas ele tinha quase certeza de que o falso grunge tinha uma quedinha por Jon Bon Jovi. Estava na cara, era só notar como ele sempre parecia prestes a desmaiar quando encara o olhar matador do homem no videoclipe.

— Qual a montanha de maior altitude da Terra, situado no continente asiático, na cordilheira do Himalaia?

Mingi e Hongjoong se viraram para encarar Yunho, entretanto só um deles tinha a resposta na ponta da língua.

— Monte Everest — o mais velho respondeu.

— Oh! — A borracha trabalhou sobre o jornal. — Eu tinha colocado outra coisa — disse ele e, logo em seguida, sorriu. Seu sorriso é como um raio de luz que age nos garotos da mesma forma, fazendo-os sentir algo subir e descer dentro de si, porém se manifesta de jeitos diferentes em cada um.

A boca seca de Hongjoong equivale aos dedinhos de Mingi, que batucam em seu queixo, ainda no ritmo da canção. Ele está louco para dar uma tragada no cigarro, isso se beijá-los estivesse fora de questão. Yunho é duro demais, sempre escapando para não se deixar cair na real; ele os queria tanto quanto eles o queriam.

Hongjoong deitou-se ao lado de Mingi, deixando-o espremidinho entre Yunho e ele, e abriu o caderno de perguntas. Tinha tanta bobagem lá, tantas memórias… Quase podia se lembrar de cada uma delas como se tivessem acontecido ontem.

Seus dedos correram pelas páginas até encontrar uma específica.

“Quem você levaria para uma ilha deserta?”, era a pergunta que estava na primeira linha. Em seguida, a resposta de Yunho — a que fazia seu coração bater feito louco — escrita com seus garranchos que nem cartilha de caligrafia daria um jeito: São duas pessoas da minha classe, mas eu não posso falar quem.

— Ok, nerds — Yunho chamou a atenção dos amigos. — Forte afeição por outra pessoa, nascida de laços de consanguinidade.

Mingi e Hongjoong trocaram olhares cúmplices. Aquela era muito fácil, oras.

Por qual outro motivo aquele não-mauricinho-de-dedos-azuis iria querer levá-los para uma ilha deserta, apesar de já terem uma não-literal e deserta o suficiente para sua insistente zona de amizade? Moleza!

É por algo singelo que começou florescendo neles como flores em um único galho. Eles conheciam o sentimento muito bem e apesar de Yunho se recusar a dizer em voz alta, a palavra sempre está prestes a escapar dele:

— Amor!